Eddie Van Feu
Com estreia no Brasil em 19 de maio pela Paris Filmes, o filme dirigido por Banjong Pisanthanakun, o mesmo de Espíritos - A Morte está ao Seu Lado (2004), A Medium conta a história de Nim, uma médium respeitada em sua comunidade que recebeu uma entidade como herança. Quando sua sobrinha manifesta sintomas estranhos, acredita-se que ela possa ser a próxima médium que receberá a divindade. SQN. A moça é possuída por uma legião de espíritos perturbados e perturbadores, demônios que buscam vingança.
Eu estava muito empolgada com esse filme porque Espíritos – A Morte está ao Seu Lado, está na minha lista de melhores filmes de terror. Tive a sorte de ver no cinema e a audiência estava animada, apesar de ser a última sessão. Em dado momento, quando o encosto estava atazanando os personagens, alguém na plateia falou:
– Se fosse aqui no Brasil era só procurar um pai de santo que resolvia isso rapidinho!
A galera riu e concordou (hoje em dia, eu não sei se a reação seria tão de boas, porque as pessoas estão mais malucas). E, na minha experiência, o cara que falou isso tinha toda a razão. Faltava aos personagens de Espíritos conhecimento do mundo espiritual para saber o que fazer, coisa que acontece muito em filmes de terror.
Em A Médium, o que não faltam são especialistas em reconhecer um problema espiritual quando veem um. Nós acompanhamos Nim e sua visão simples da vida. Vemos os rituais, que muito se assemelham aos nossos rituais afrobrasileiros. Sua irmã, que recusou a herança mediúnica, se converteu ao cristianismo e vende carne de cachorro em um açougue ilegal, o que por mim já rende um karma básico.
Quando a sobrinha de Nim começa a se comportar estranhamente, esperamos que Nim e conhecidos médiuns seus saibam o que fazer. Estamos meio certos e meio errados.
O filme tem problemas. No estilo found footage, ele simula um documentário sobre a Nim e sua mediunidade. Particularmente, eu não curto esse estilo, em que a história é contada através do ponto de vista de uma ou mais câmeras nas mãos de pessoas que pretendem ser amadoras. Apesar de não ser meu estilo, ele conseguiu prender meu interesse, talvez pela simpatia da personagem Nim, talvez pelos rituais e visual interessante.
Os problemas começam mesmo quando os personagens demoram demais para perceber o que está acontecendo. Nim parecia ser mais esperta, mas demora até tomar uma atitude. A mãe da moça possuída, a que tem o açougue ilegal, é realmente meio limitada e seus erros até se justificam por essa limitação. Nim encontra ajuda em um outro médium, que parece bem seguro do que faz. E ele também comete erros crassos.
Basicamente, o filme é a sinopse. E ele poderia ser muito mais rico do que isso, com uma cultura exótica cheia de possibilidades de surpreender o espectador. Mas o roteiro joga algumas informações importantes de forma muito vaga, e ninguém parece dar muita atenção. Nim tira do chapéu que o espírito que está possuindo a sobrinha é de um suicida da família. A informação não se baseia em nada, além do achômetro dela e quando ela percebe que está errada, parece uma grande surpresa, mas qualquer um que esteja vendo o mesmo que ela (que tem acesso às filmagens das câmeras do documentário), saberia disso.
A preparação do ritual final é muito bacana e mostra que magia não é mágica e que é preciso muito trabalho, muita atenção e muito conhecimento para se fazer determinados rituais de grande porte, como um exorcismo. O problema é que quando se faz um ritual desse tamanho, você presta atenção em coisas básicas como, por exemplo, não deixar bebês e pessoas despreparadas tomando conta da pessoa possuída. Não é preciso ser um exorcista do Vaticano para saber isso. Ou, não deixar a pessoa possuída com acesso livre à casa na semana em que ela será exorcizada, especialmente se ela já demonstrou comportamento perigoso para si mesma ou para os outros. Outros erros básicos vão sendo cometidos, o que nos leva a crer que os personagens estão à serviço do roteiro. Eles não são burros, mas o roteiro precisa que eles façam burrices, para chegar aonde o roteirista quer que chegue.
O local do ritual parece ter uma importância na trama, mas ela jamais é explicada. O que é aquele prédio? Por que está abandonado? Por que é importante? Por que ele está no meio do mato? Por que tem que ser ali? As poucas explicações foram dadas de forma muito simplista, praticamente jogadas, e são insuficientes para que possamos entender direito o que está acontecendo.
O mais legal de um filme de terror é compreender o que está acontecendo e POR QUÊ! E isso não é entregue de forma satisfatória. O que é estranho, já que isso foi perfeitamente entregue em Espíritos, cujo roteiro tem vários pontos de virada. A Médium não muda seu rumo em momento algum, carece de movimento.
Outra coisa que não faz sentido é a presença onipotente das entidades que possuem a moça e a total apatia das entidades do bem. Numa situação comum, com pessoas comuns, já é frustrante ver pessoas sem saber o que fazer e sem ferramentas para lidar com o problema que o roteiro lhes dá. Até entendemos quando elas morrem, porque afinal não sabiam fazer uma oração de exorcismo, um ritual de banimento e nem conheciam ninguém que soubesse fazer isso. Eram pobres idiotas em uma situação terrível. Agora, numa comunidade que praticamente vive aquilo, é imperdoável não ver entidades dispostas a deter aquela praga, já que havia rituais e médiuns à rodo por ali.
Conforme a possessão evolui, o filme descamba para o exagero temperado com gore, o que pode agradar uma fatia da audiência. No mais, vale pelos rituais e por apresentar uma cultura nova. Um bom roteirista teria feito um ótimo trabalho com esse material. Mas ele deve ter sido possuído por um fã de A Bruxa de Blair.
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