quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Os Filmes do Oscar: ME CHAME PELO SEU NOME – quatro indicações


Por Ricky Nobre


O cinema de temática LGBT não é tão raro quanto se pensa. Todo ano no Festival do Rio, por exemplo, existe uma mostra de filmes com esse enfoque. É necessário, porém, ater-se ao cinema independente, pois fora dele a produção sobre o tema é de fato muito escassa. Vez ou outra, algum desses filmes quebra a barreira e atinge um público mais amplo. Com quatro indicações ao Oscar, Me Chame Pelo Seu Nome chega com um hype considerável, alavancado pelo grande sucesso do livro que o inspirou.

 

Numa vila do século XVII, ao norte da Itália, o jovem e introvertido Elio passa o verão às voltas com seu piano e música clássica, quando chega Oliver, um aluno de seu pai professor de arqueologia, para trabalhar como seu assistente durante as férias. Após certo estranhamento inicial, os dois passam cada vez mais tempo juntos até florescer um romance entre os dois. 

 

Nos dias de hoje, parece bastante relevante o “lugar de fala” onde um grupo específico fala por si. O fato de André Aciman, autor do livro original, ser hétero, assim como os atores principais Armie Hammer e Timothée Chalamet, é suficiente para lançar certa controvérsia sobre a “autenticidade gay” do filme. Ele, porém, passou por dois filtros mais do que relevantes: o do diretor Luca Guadagnino e do roteirista James Ivory, ambos homossexuais assumidos. Ivory, inclusive, que já abordou a homossexualidade na era vitoriana no belo Maurice (1988), era o mais cotado para dirigir o filme. Porém, beirando os 90 anos de idade, não possuía mais fôlego para tal, e a cadeira do diretor passou para Guadagnino.

 

Apesar da diferença entre os cinemas dos dois cineastas, o filme de Guadagnino tem o DNA de Ivory espalhado por todo canto. É como se estivéssemos vendo os velhos filmes repletos de beleza e elegância que a Merchant/Ivory costumava produzir nas décadas de 80 e 90. A belíssima fotografia no calmo cenário interiorano europeu constrói uma atmosfera onde até sofrer é algo a ser feito elegantemente.

 

Talvez um grande erro que se cometa ao se construir expectativas, ou mesmo ao “ler” o filme, é considerá-lo um exemplar de cinema gay, quando a história é sobre o romance de dois jovens evidentemente bissexuais. E Guadagnino claramente procurou contar uma história de amor sem qualquer contextualização social ou política das questões LGBT. Isolados no tempo e no espaço (uma cidadezinha no interior da Itália em 1983) Elio e Olive vivem uma paixão com data de validade, um típico amor de verão, e não há problematização maior disso além de um possível coração partido da moça com quem Elio se encontra.

 

É bastante curioso também o quanto que as cenas de sexo são comportadas. Guadagnino já foi muito mais explícito ao retratar sexo hétero em filmes como 100 Escovadas Antes de Dormir e Um Mergulho no Passado. Porém, quando surge a oportunidade de lidar com sexo gay, com o qual ele seria supostamente mais intimo, ele escolhe a discrição, suavidade e a sugestão. Não se sabe se ele achou que “pesou a mão” nos filmes anteriores, se tentou fazer um filme mais “amigável” para um público hétero mais vasto, ou se ele simplesmente achou que esse era o tom correto para a história que estava contando, apesar de tanto o livro de Aciman quanto o roteiro de Ivory conterem cenas de sexo bem menos comportadas que o diretor acabou cortando ou suavizando.

 

De fato, existe um comedimento geral em Me Chame Pelo Seu Nome. Nenhum dos dois protagonistas possui qualquer comportamento “afetado”, assim como mantêm uma “aparência hétero” sólida. Na verdade, cada um tem um perfil radicalmente distinto um do outro. Elio é um adolescente intelectualizado, de compleição magérrima e personalidade reservada. Já Oliver é extrovertido, atlético, com rosto, voz e cabelo perfeitos, o exato oposto de Elio, e os dois acabam formando dois estilos de beleza e sensualidade masculinos bem específicos, distintos e, honestamente, clichês. Essa “atração de opostos” poderia parecer horrivelmente forçada, mas a verdade é que o roteiro é tão competente ao conceber o romance entre eles e a química entre os atores é tão perfeita, que compramos sem questionar esse caso de amor que parece ter sido feito sob medida para encantar a públicos de quaisquer orientações sexuais sem causar desconforto a ninguém. 

 

Me Chame Pelo Seu Nome tem, assim, o imenso mérito de sobreviver a todos os possíveis artifícios que poderiam torná-lo um filme insípido e ser um filme verdadeiramente adorável, belo, sensual e agridoce. E talvez a grande declaração política de Guadagnino neste filme tenha sido justamente a ausência de uma. Ao mostrar um romance entre homens sem ataques homofóbicos, sem vergonha (no melhor dos sentidos), onde o jovem Elio ainda pode contar com os melhores pais do mundo para apoiá-lo, Guadagnino cria um idílico mundo ideal onde um amor é apenas um amor, que já pode ser belo e sofrido o suficiente, sem o peso que a sociedade impõe.


COTAÇÃO: 


 
ME CHAME PELO SEU NOME (Call Me By Your Name, 2017)
Com: Armie Hammer, Timothée Chalamet, Michael Stuhlbarg, Amira Casar e Esther Garrel.
Direção: Luca Guadagnino          
Roteiro: James Ivory, baseado no livro de André Aciman
Fotografia: Sayombhu Mukdeeprom
Montagem: Walter Fasano

INDICAÇÕES AO OSCAR:
Melhor filme
Melhor ator: Timothée Chalamet
Roteiro adaptado: James Ivory, baseado no livro de André Aciman
Canção original: "Mystery of Love" por Sufjan Stevens

A Maldição da Casa Winchester (Dica de filme de Terror) - Chá das Cinco #211


Eddie Van Feu fala sobre o filme de terror que conta a história da herdeira de uma empresa de armas de fogo (Helen Mirren) e de sua casa macabra.

Edição: Paulo Kunze



terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

A MALDIÇÃO DA CASA WINCHESTER - CRÍTICA

por Eddie Van Feu


Para alguém que detesta obras como eu, o terror já começa quando descobrimos que a mansão em questão vive 24 horas em construção. Martelos, quebra-quebra, homens para lá e para cá, tudo para cumprir os desejos de uma viúva excêntrica. O problema é que essa viúva é a maior acionista da fábrica de armas mais lucrativa da história: os famosos rifles Winchester. Preocupados com a parte deles nos lucros a sanidade da viúva, os outros acionistas contratam um psiquiatra viciado e endividado para garantir um laudo médico que a considerasse biruta e maluca de pedra incapaz de gerir os negócios da empresa. O psiquiatra então vai até a mansão e, cético até o talo, precisa lidar com coisas esquisitas.

A verdadeira mansão Winchester hoje é um ponto turístico dos amantes do sobrenatural.
O filme começa com uma boa promessa. Apesar dos gatos pulando do armário (aqueles sustos que não são nada, mas fazem você pular da cadeira), dá pra ver que há motivos para se temer aquela casa, com mais de cem cômodos completamente caóticos e aleatórios. 

A verdadeira Sarah Winchester e Helen Mirren.

Inspirado em fatos reais, o filme instiga a curiosidade, mas entrega um pouco cedo demais o mistério. O visual é muito bonito, com um elenco eficiente. Helen Mirren está ótima como a viúva Sarah Winchester, uma presença imponente e bizarra que circula pelos corredores da casa. Sarah Snook também convence como a sobrinha, também viúva, e mãe de um menino. Já o menino Henry (Finn Scicluna-O'Prey) é fraco e não deram texto para ele. Jason Clarke interpreta o psiquiatra atormentado Eric Price e não teria sido minha primeira (ou segunda, ou terceira) escolha para o papel. Falta-lhe carisma e simpatia. Angus Sampson é uma das boas surpresas do filme. Ele era um dos nerds caçadores de fantasmas na série Sobrenatural e aqui é o mestre de obras que apoia Sarah em suas bizarrices.

Visão aérea da mansão Winchester hoje, com suas construções completamente caóticas e assombradas.

A verdadeira mansão, na Califórnia, teve construção por 24 horas durante 38 anos, começando em 1884 e só sendo interrompida em 05 de setembro de 1922, quando Sarah faleceu. Gastou-se nisso cerca de 5.5 milhões de dólares, equivalentes a 71 milhões de dólares em 2010. Dizia-se que Sarah acreditava que a mansão era assombrada pelas vítimas dos que morreram pela arma de sua empresa.

Faltou química aí. Ou direção. Não sei ainda.
Essa simples premissa já dá um material poderoso para um filme de terror muito bom! Mas algo aconteceu, e o filme não engrena. Falta um pouco de coerência para os eventos sobrenaturais. E dá muita curiosidade de sabermos das histórias dos fantasmas da casa. Por sua vez, a assombração mais sinistra da casa não é muito convincente, tendo poderes que não fazem sentido e ações em vida que também não faziam sentido. Poderia ter sido um filme de terror épico, daqueles ricos em história e que nós contamos para todo mundo depois. Só que chegamos ao final percebendo que a resolução não convence, os dramas pessoais não comovem e metade do elenco não é insossa... Mas pelo menos os fantasmas assustam! Tem fantasma, tem susto, tem surpresa, então, na minha opinião, já vale a entrada do cinema.


Eddie Van Feu é jornalista e gostaria de visitar a verdadeira Mansão Winchester e escrever um roteiro decente para essa história.




PRIMEIRA FOTO DO MARVEL DA DC

por Renato Rodrigues
Saiu por esses dias a primeira imagem (Tirada pela sua tia que não entendeu até agora, mesmo com a Globo explicando, que é pra tirar foto com o celular deitado) do Capitão Marvel (Zachary Levi) com o uniforme muito fiel ao original!



Agora imagine a confusão que vai ser: neguinho já se confunde esperando o Homem de Ferro aparecer na Liga da Justiça e Batman nos Vingadores... agora vai ter um filme da DC com o Capitão MARVEL?

Vai ter até gente perguntado quando é que aparece o Mandrake e o Flash Gordon, tipo aqueles esquetes dos Trapalhões.

Resultado de imagem para Trapalhões super herois

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Prêmio Framboesa de Ouro perdeu a noção? - Chá das Cinco #210

É semana do Oscar, mas HOJE vamos falar dos polêmicos indicados daquele outro prêmio que escolhe os PIORES do ano: Que raio de critério foi usado esse ano? 

com os piores do ano: Renato Rodrigues, Eddie Van Feu, Ricky Nobre, Patrícia Balan e JM




Esse é um prêmio cinematográfico humorístico dos EUA onde figuram os piores do ano. Veja a relação:
PIOR FILME
Baywatch
Emoji: O Filme
Cinquenta Tons Mais Escuros
A Múmia
Transformers: O Último Cavaleiro

PIOR ATRIZ
Katherine Heigl (Paixão Obsessiva)
Dakota Johnson (Cinquenta Tons Mais Escuros)
Jennifer Lawrence (mãe!)
Tyler Perry (Boo 2! A Madea Halloween)
Emma Watson (O Círculo)

PIOR ATOR
Tom Cruise (A Múmia)
Johnny Depp (Piratas do Caribe - A Vingança de Salazar)
Jamie Dornan (Cinquenta Tons Mais Escuros)
Zac Efron (Baywatch)
Mark Wahlberg (Pai em Dose Dupla 2 e Transformers: O Último Cavaleiro)

PIOR ATOR COADJUVANTE
Javier Bardem (mãe! e Piratas do Caribe - A Vingança de Salazar)
Russell Crowe (A Múmia)
Josh Duhamel (Transformers: O Último Cavaleiro)
Mel Gibson (Pai em Dose Dupla 2)
Anthony Hopkins (Collide e Transformers: O Último Cavaleiro)

PIOR ATRIZ COADJUVANTE
Kim Basinger (Cinquenta Tons Mais Escuros)
Sofia Boutella (A Múmia)
Laura Haddock (Transformers: O Último Cavaleiro)
Goldie Hawn (Viagem das Loucas)
Susan Sarandon (Perfeita é a Mãe 2)

PIOR COMBO
Qualquer combinação de dois personagens, brinquedos sexuais ou posições sexuais (Cinquenta Tons Mais Escuros)
Qualquer combinação entre dois humanos, dois robôs ou duas explosões (Transformers: O Último Cavaleiro)
Qualquer encontro de dois emojis (Emoji: O Filme)
Johnny Depp e seu estilo bêbado de atuar (Piratas do Caribe - A Vingança de Salazar)
Tyler Perry e qualquer vestido velho ou peruca ruim (Boo 2! A Madea Halloween)

PIOR REFILMAGEM/CÓPIA/SEQUÊNCIA
Baywatch
Boo 2! A Madea Halloween
Cinquenta Tons Mais Escuros
A Múmia
Transformers: O Último Cavaleiro

PIOR DIRETOR
Darren Aronofsky (mãe!)
Michael Bay (Transformers: O Último Cavaleiro)
James Foley (Cinquenta Tons Mais Escuros)
Alex Kurtzman (A Múmia)
Tony Leondis (Emoji: O Filme)

PIOR ROTEIRO
Baywatch
Emoji: O Filme
Cinquenta Tons Mais Escuros
A Múmia
Transformers: O Último Cavaleiro

domingo, 25 de fevereiro de 2018

Os Filmes do Oscar: DUNKIRK – oito indicações


Por Ricky Nobre


Mal a Segunda Guerra Mundial começou e ela já teve um de seus momentos mais tensos. Em maio de 1940, cerca de 400 mil soldados, entre franceses e quase toda a Força Expedicionária Britânica, se viram encurralados na cidade de Dunquerque pelas forças alemães. Com apenas duas semanas no cargo de primeiro ministro, Churchill se via numa posição extremamente delicada (como pode ser visto em outro filme indicado ao Oscar, A Hora mais Escura). Graças à impressionante ousadia da Operação Dínamo, quase mil pequenas embarcações particulares foram empregadas no resgate das tropas, numa manobra extremamente arriscada. Christopher Nolan, em seu primeiro filme baseado em fatos reais, traz seu cinema intelectual e matemático para retratar esse momento crítico da História.

 

Dunkirk é, ao mesmo tempo, a negação e o ápice do cinema de Nolan. Sua estrutura temporal complexa, onde uma semana em terra, um dia no mar e uma hora no ar se interpolam de forma imensamente sofisticada como era de se esperar, é o principal trunfo narrativo e estético do filme. Nolan já jogou com narrativas temporais antes, mas, com certeza, é sua experiência mais sofisticada nesse âmbito desde Amnésia, a pequena obra prima que o colocou no mapa em 2000. 

 

Por outro lado, seus filmes têm, invariavelmente e independente de sua qualidade, roteiros extremamente elaborados do ponto de vista da trama e dos personagens. Não é o caso aqui. Como se tentasse sair do seu próprio lugar-comum, o dos grandes épicos de quase três horas, com diálogos longos e intrincados e tramas que são verdadeiros quebra-cabeças, Nolan constrói Dunkirk como um filme que sequer tem um personagem que se possa considerar um protagonista, embora o soldado interpretado por Fionn Whitehead seja, de certa forma, tratado como tal. Com pouquíssimos diálogos e uma trama de complexidade zero, fica a cargo da construção narrativa todo o mérito e atrativo do filme que totaliza meros 106 minutos de duração, sendo o filme mais curto da carreira do diretor. 

 

Tecnicamente, Dunkirk é o primor que se espera de Nolan. Parte filmado em película IMAX e parte em película 70mm, a produção mantém Nolan em sua paixão em filmar com FILME, em consistente e resoluta rejeição ao digital. Em busca de autenticidade, ele confirma sua predileção por poucos efeitos em CGI e se utiliza de uma enorme quantidade de embarcações e aviões verdadeiros, muitos deles da época. Vários caças spitfires são relíquias legítimas, assim como vários navios e até mesmo, das 100 embarcações pequenas usadas no filme, 12 são relíquias reais que realmente participaram do resgate dos soldados em 1940. Até mesmo miniaturas de aviões pilotadas com controle remoto foram preferidas a efeitos digitais. 

 

A simplicidade extrema da trama acaba apresentando problemas. Em sua alta sofisticação narrativa, o filme acaba por sofrer com personagens que não vão além da profundidade de soldados de chumbo. Com certa frequência, e particularmente em um dos últimos momentos tensos do filme, Nolan aposta em nosso temor pelo destino de seus personagens, mas simplesmente não há identificação possível, nem é razoável a intenção do diretor que o público sinta alívio com a sobrevivência de um personagem específico do qual nada sabemos em detrimento de outros personagens igualmente anônimos que queimam na água. 

 

Nolan, por vezes, perde a mão na construção da tensão, principalmente ao utilizar-se da verdadeiramente abominável trilha musical de Hans Zimmer e Benjamin Wallifisch. Com certa obsessão pela ilusão de crescendo infinito, Nolan tem Zimmer como seu compositor de preferência há vários anos. Aqui, ele chega ao ápice da construção musical com o papel de efeitos sonoros e não oferece qualquer espécie de variação além da progressão de ritmos eletrônicos absolutamente genéricos, sem qualquer instrumentação que se relacione com o período de filme e sem nenhuma variação de acordo com os acontecimentos na tela, onde “mais tensão” vira sinônimo de “mais volume” e o alívio não é musical, mas a ausência abrupta da música. Apenas nos momentos finais, a música muda de tom para um alívio da tensão verdadeiramente musical, mas isso é feito meramente com o uso da peça clássica Nimrod de Elgar, tocada de forma extremamente lenta e com arranjo pobre. 

 

Dunkirk é um filme concebido com um objetivo bastante claro e simples: narrar de forma objetiva uma das operações mais famosas e impressionantes da Segunda Guerra Mundial e, ao fazê-lo, dispensar quaisquer divagações ou distrações, como conjecturar sobre o que é considerado o último grande mistério da Segunda Guerra, que é o porquê de Hitler ter ordenado suspensão dos avanços a Dunquerque. Sequer a presença alemã efetiva no combate tem qualquer espécie de atenção, e a única vez que vemos soldados alemães na tela, eles estão fora de foco. Durante todo tempo, eles estão invisíveis em esquinas ou dentro de caças. Nolan busca o drama humano naquela retirada desesperada proporcionada por cidadãos civis que, numa inversão do lugar comum, zarpam para salvar os militares. A costura das linhas de tempo é primorosa, assim como é apoteótico o encontro das três ao final. Personagens unidimensionais, entretanto, não ajudam nessa tarefa de emocionar o espectador, que acaba mais impactado pela extraordinária reprodução do cenário das batalhas do que pela emoção na tragédia da guerra e na abnegação do heroísmo. É a vitória e o fracasso do cinema-exato de Nolan.

 

COTAÇÃO: 
 
DUNKIRK (2017)

Com: Fionn Whitehead, Mark Rylance, Tom Glynn-Carney, Tom Hardy, Kenneth Branagh e Cillian Murphy.

Roteiro e direção: Christopher Nolan

Fotografia: Hoyte van Hoytema

Montagem: Lee Smith

Música: Hans Zimmer



INDICAÇÕES AO OSCAR:

Melhor filme

Diretor: Christopher Nolan

Fotografia: Hoyte van Hoytema

Montagem: Lee Smith

Música: Hans Zimmer

Edição de som: Richard King e Alex Gibson

Mixagem de som: Mark Weingarten, Gregg Landaker e Gary Rizzo

Direção de arte: Nathan Crowley e Gary Fettis

sábado, 24 de fevereiro de 2018

Os Filmes do Oscar: TRÊS ANÚNCIOS PARA UM CRIME – sete indicações


Por Ricky Nobre


Histórias que envolvem crimes violentos, perda de familiares (filhos, principalmente), cobranças a autoridades por falta de resultados e busca por justiça a qualquer preço trazem, invariavelmente, um tom catártico, onde o espectador pode se identificar com a dor do protagonista e embarcar em sua cruzada contra a injustiça e a impunidade. Quem vê o trailer de Três Anúncios para Um Crime e segue pelos primeiros dez minutos de filme tem a impressão de que ele seguirá esse caminho, apenas com a adição de certo humor mordaz. Mas é aí que ele começa numa ininterrupta subversão de expectativas que se espalha por todos os personagens. 

 

Após quase um ano do estupro e morte da filha, Mildred (Frances McDormand) expõe em três outdoors sua revolta com o xerife Willoughby (Woody Harrelson) pela absoluta ausência de qualquer resolução para o caso. Ela passa a enfrentar não apenas a hostilidade da polícia, mas também da população, que tem o xerife em alta conta. 

 

Cada personagem vai sendo apresentado segundo seus clichês previsíveis: a mãe revoltada com a impunidade, o xerife que não aceita críticas, o policial racista e violento, e por aí vai. Mas não demora muito para camadas serem adicionadas aos personagens, uma a uma, e elas não param de se sobrepor até o fim dos 115 minutos de projeção. O diretor e roteirista Martin McDonagh, com impressionantes coragem, sensibilidade e inteligência, comanda um elenco excepcional e não deixa nenhuma primeira impressão sem um segundo ou terceiro ponto de vista. 

 

Mais do que apenas um roteiro imprevisível pelos “pontos de virada”, McDonagh constrói seu filme com interesse específico nos personagens e contraria as expectativas do público não como um simples recurso narrativo, mas para explorar a humanidade de todos na tela. Talvez o único personagem que não vá além do simples clichê cômico inicial seja a namorada teen do ex-marido, mas é perfeitamente compreensível dada sua inexpressividade dentro da trama. 

 

Num filme com uma veia cômica tão bem marcada, o drama, a culpa e sucessivos socos no estômago do espectador se sucedem sempre surpreendendo, pegando o público “de calças na mão”, seja por um ato de ódio declarado, seja por um gesto de bondade e altruísmo totalmente inesperado. Aparentemente despretensioso, Três Anúncios para Um Crime é um filme profundamente HUMANO como raramente se vê. 

 

COTAÇÃO: 


 
TRÊS ANÚNCIOS PARA UM CRIME (Three Billboards Outside Ebbing, Missouri, 2017)
Com: Frances McDormand, Sam Rockwell, Woody Harrelson, Zeljko Ivanek, Lucas Hedges e Peter Dinklage.
Roteiro e direção: Martin McDonagh
Fotografia: Ben Davis
Montagem: Jon Gregory
Música: Carter Burwell

INDICAÇÕES AO OSCAR:
Melhor filme
Atriz: Frances McDormand
Ator coadjuvante: Sam Rockwell
Ator coadjuvante: Woody Harrelson
Roteiro original: Martin McDonagh
Música original: Carter Burwell
Montagem: Jon Gregory

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

Altered Carbon (DIca de série) - Chá das Cinco #209


JM trouxe a dica de série de hoje, a série Altered Carbon. A primeira temporada tem dez episódios e estreou na Netflix esse ano.

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

Fábulas Ferais (Dica de Leitura) - Chá das Cinco #208


A Dany Fernandez traz mais uma dica de leitura nacional pra gente. É o livro "Fábulas Ferais" da escritora Ana Cristina Rodrigues


Aproveite e visite o blog da Dany www.baratoliterario.com.br

terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Os Filmes do Oscar: BLADE RUNNER 2049 - cinco indicações

Por Ricky Nobre 



Alguns filmes estão longe de serem uma unanimidade, mas são clássicos no mais completo sentido da palavra. O lugar de Blade Runner (1982) na história do cinema não veio instantaneamente e a saga do filme é conhecida. Insatisfeita com o resultado final após uma exibição teste, a Warner tirou o filme do controle do diretor Ridley Scott e do produtor Michael Deeley e promoveu uma série de alterações, principalmente uma narração tola e desnecessária, onde o personagem Deckard ia explicando ao público o que ia acontecendo, e um final feliz postiço, costurado com refilmagens de última hora e imagens de arquivo rodadas para O Iluminado de Kubrick, dois anos antes. Não adiantou. A produção de 28 milhões de dólares arrecadou pouco mais de 30 milhões mundialmente, sendo que a versão internacional era um pouco mais violenta que a americana. Embora ele não pretendesse ser um grande filme de ação no sentido estrito, ele foi vendido desta forma, e o público não gostou. Mas era o início da década de 80 e o formato VHS estava em ascensão, o que permitiu ao filme ser redescoberto como uma ficção científica mais sofisticada, tanto na temática quanto na estética, tornando-se um fenômeno cult e o primeiro grande filme da estética e estilo cyberpunk, dando a Hollywood o primeiro lampejo do poder do mercado de home vídeo de salvar um investimento. 

 

Desde então, Blade Runner é considerado um dos grandes clássicos da história do cinema. Em 1991, a cópia usada na exibição teste original foi parar acidentalmente num festival, e a ausência de narração e do “final feliz” fez enorme sucesso e foi parar em outros festivais. Ciente do sucesso, a Warner deu sinal verde para uma “versão do diretor”, o que trouxe o filme mais perto da visão original, apesar de Scott não ter podido supervisionar o trabalho na época. Apenas em 2007 ele lançou sua “versão final” que, entre dezenas de pequenos ajustes, também incluía uma questionável e radical mudança na paleta de cores do filme. Todas essas cinco versões foram lançadas em boxes de DVD e Bluray.

 

Originalmente concebido como um film noir futurístico, com uma direção de arte e figurinos que evocavam os anos 40 e com paisagens urbanas inspiradas em Metropolis (1926), Blade Runner sempre foi motivo de discussão quanto a seus temas envolvendo inteligência artificial, escravidão, o direito à vida, entre outros, inclusive o quanto suas qualidades temáticas e estéticas compensavam o desenvolvimento limitado de seus personagens e suas relações. Especulações sobre uma continuação foram comuns ao longo do tempo, mas se concretizaram apenas na forma de dois livros, e a ideia de um Blade Runner 2 sempre pareceu tão estúpida quando uma continuação de E.T., Casablanca ou Taxi Driver. Inicialmente pensado para Christopher Nolan, o projeto passou para o próprio Ridley Scott que, após desenvolver o roteiro com Hampton Fancher (um dos roteiristas originais) e Michael Green, decidiu se dedicar Alien Covenant e atuar apenas como produtor. Entra em cena Denis Villeneuve, que nos trouxe o sensacional A Chegada, talvez a melhor ficção científica da década, e é o responsável pelo novo projeto de levar toda a saga de Duna aos cinemas. Nas mãos de Villeneuve, a ideia estúpida torna-se um evento aguardando com imensa ansiedade por fãs de cinema de todo o mundo. 

 

Em 2049, trinta anos após os eventos do filme original, os replicantes são muito mais confiáveis e controláveis, tornando-se parte corriqueira da vida diária. Apenas modelos antigos foragidos são caçados por blade runners. K (Ryan Goslin) é um blade runner que encontra uma ossada de uma replicante que, segundo a perícia, deu a luz antes de morrer. Sua superior Tenente Joshi (Robin Wright) acredita que a notícia de que um replicante foi capaz de procriar causará uma convulsão social e ordena que K descubra se esse replicante “nascido” existe e, se for o caso, o mate. Paralelamente, o magnata que controla a produção de replicantes Niander Wallace (Jared Leto) quer encontrar o replicante antes de K para estuda-lo, numa investigação que pode levar o blade runner a segredos do seu próprio passado.

 

Se a natureza de Rick Deckard é até hoje objeto de discussão, a escolha de apresentar K como um replicante já na primeira cena serve como um meio de trazer, logo de início, o público para o lado daqueles que foram os “vilões” do filme original. A Tenente Joshi não possui o menor constrangimento em falar da inferioridade dos replicantes e do quanto a manutenção dessa relação é imperativa para a “ordem social”, tudo ali, em conversas diretas com K, como se ele realmente fosse um objeto incapaz de sentir ofendido. Na rua e no próprio prédio onde mora, K ouve estoicamente incessantes ofensas por ser quem é. Em casa, porém, ele encontra afeto e conforto em sua relação com Joi, inteligência artificial cuja imagem é holograficamente projetada, criada para se tornar a companheira que o usuário quiser. Há uma clara “hierarquia evolutiva” que separa Joi, com sua programação binária clássica, de K, com programação quaternária mais complexa. Os dois são produtos, criados para fins específicos, e ainda que se possa considerar que o afeto de Joi seja uma simulação prevista por programação, este apenas se torna mais intenso e “palpável” à medida em que o filme avança; mas, acima de tudo, é um afeto intenso e recíproco que supera quaisquer diferenças entre o “superior” e o “inferior”. Criados para serem escravos, eles têm, ao fim das contas, apenas um ao outro.

 

Em determinado ponto, Wallace sugere que a sociedade encontrou nos replicantes uma forma de escravizar sem os dilemas morais que acompanham a prática. Mais preciso seria afirmar que os replicantes, que são essencialmente clones humanos com cérebros programáveis, são uma nova forma de fazer o que sempre se fez para manter um grupo escravizado: desumanizá-los. Desta forma, temos os replicantes como centros emotivos do filme, enquanto os humanos parecem, invariavelmente, cruéis; tanto que continuam escravizando os seus, como K descobre ao localizar um campo de trabalho infantil. Nesse aspecto, um dos principais problemas do filme é a forma caricata e histriônica com que o personagem Wallace foi escrito, ainda que seja tentador pôr toda a culpa na interpretação de Jared Leto (mais uma vez, pagando o mesmo pato que já pagara com seu Coringa). 

 

É difícil não imaginar que o filme esteja realmente em melhores mãos do que estaria com Ridley Scott, a julgar por sua filmografia recente. Villeneuve imprime sua própria identidade e ritmo ao filme. Seus 164 minutos não são abarrotados nem de ação nem de informações objetivas. Não há pressa em apresentar personagens, ambientes, fatos e a própria investigação. Villeneuve sai do ambiente urbano caótico que marcou o filme original e se desloca para cenários mais remotos, abertos e desertos, expandindo a noção de um mundo que, de fato, passou por algum tipo de apocalipse, arrasado e repleto de excluídos, justificando a produção em massa de replicantes para trabalhar na colonização de outros planetas. A belíssima fotografia de Roger Deakins constrói essa desolação das paisagens e enfatiza a solidão de K. 

 

Uma coisa surpreendente em um filme que procura ser o máximo que pode uma obra íntegra, é a impressionante quantidade de fanservice! O filme original é constantemente referenciado (e reverenciado!) nas mais variadas formas, das mais expressivas às mais sutis. Correndo enorme risco, o filme tenta ser perfeitamente absorvido por um novo público que sequer viu o original, ao mesmo tempo em que faz inúmeras conexões com o original, onde os dois filmes podem ser vistos como uma obra única. Nesse caldeirão de referências, a música de Hans Zimmer e Benjamin Wallfisch citam constantemente os temas e o estilo de Vangelis, ainda que, na maior parte do tempo, sigam seu estilo comum, que é a da música que soa como sound design, que é o estilo preferido de Villeneuve, vide suas colaborações anteriores com Johann Johannson. 


 

Seguindo a dubiedade do primeiro filme, existem sugestões na trama que, mais uma vez, deixam dúvida sobre a velha pergunta de se Deckard é ou não replicante. Dependendo de como o espectador interpreta essas sugestões, pode ocorrer uma certa irritação quanto ao que pode ser considerado “retcon” (continuidade retroativa, ou seja, alterar fatos já estabelecidos em obra anterior), mas, como já foi dito, são apenas possibilidades que o filme abre. Os efeitos especiais, excelentes em praticamente todo o filme, dão uma feia escorregada quando trazem de volta um personagem clássico do filme original, numa recriação tão engessada, fria e inexpressiva, que acaba drenando toda a emoção de uma cena que deveria ser impactante, ainda que Harrison Ford tenha dado o melhor de si nela. 



 Blade Runner 2049 não é um filme perfeito, mas é infinitamente melhor do que se poderia esperar de uma continuação tão tardia de uma obra tão clássica. Provavelmente é o maior hiato que já existiu entre uma parte 1 e uma parte 2. Foram 35 anos que Blade Runner teve para ser descoberto, redescoberto, interpretado, relançado, reeditado, discutido, idolatrado, questionado e, principalmente, reassistido. Sua tardia sequencia também terá anos para ser debatida, uma vez que, desde sua estreia, já possui fervorosos fãs e indignados críticos, que ao longo dos anos discutirão se Joi é mesmo a personagem virtual mais adorável da ficção científica; se Ryan Goslin tem mesmo o carisma de um chuchu ou se é apenas um ator com estilo minimalista que casa perfeitamente com seu personagem; se o Deckard septuagenário briga muito melhor do que no filme original onde ele praticamente só apanhava; se o filme carece de uma interpretação tão boa quanto a de Rutger Hauer e de um diálogo tão icônico quanto o de sua última cena; se as questões e temáticas levantadas pelo filme original foram realmente trabalhadas de forma tão mais profunda na obra de 1982 do que foram as do filme de 2017. Ou se em 2052, daqui a 35 anos, farão outro filme com a brecha aberta com o final deste. Ou daqui a 2 anos. Ou nunca. Blade Runner 2049 segue os passos do filme original ao fracassar nas bilheterias americanas. Mas segue a tendência deste ano, ao se sair substancialmente melhor no mercado externo. Amado ou odiado, o novo Blade Runner ousou seguir os passos do original ao não ser concebido como um blockbuster de verão, mas como uma ficção científica de verdade. 


COTAÇÃO: 

BLADE RUNNER 2049 (EUA, 2017) 
Com: Ryan Goslin, Harrison Ford, Ana de Armas, Robin Wright, Sylvia Hoeks, Jared Leto, Mackenzie Davis e Carla Juri 
Direção: Denis Villeneuve 
Roteiro: Hampton Fancher e Michael Green 
Fotografia: Roger Deakins  
Montagem: Joe Walker 
Música: Hans Zimmer e Benjamin Wallfisch

INDICAÇÕES AO OSCAR:

Fotografia: Roger Deakins 
Edição de som: Mark Mangini e Theo Green
Mixagem de som: Ron Bartlett, Doug Hemphill e Mac Ruth
Direção de arte: Dennis Gassner e Alessandra Querzola
Efeitos Visuais: Gerd Nefzer, John Nelson, Paul Lambert e Richard Hoover