Por Ricky Nobre
FILME 3: ROOM 999
40 anos após o emblemático documentário de Wim Wenders, onde ele perguntou aos cineastas presentes em Cannes sobre o futuro do cinema, Lubna Playoust refaz a indagação num ambiente de tanta insegurança quanto o de 1982, onde a hegemonia da TV e o início do home video (que ainda cresceria muito) eram percebidas como ameaça, uma profecia da morte do cinema, de sua linguagem. Em 2022, diretores de Cronemberg a Östlund falam de suas preocupações (ou não) quanto ao streaming, à Internet como um todo, a ida às salas de cinema como um hábito cada vez menos popular e a capacidade de concentração das novas gerações.
O formato de Quarto 999, que é idêntico ao de Quarto 666, é de um estilo de documentário que deixa 95% de si nas mãos dos entrevistados. Tudo que ele tem é a potência da pergunta e a forma como será definida a ordem dos depoimentos. Daí, podemos dizer que este se inicia justamente com seu momento mais potente. Wim Wenders, diretor do filme anterior, responde à própria pergunta que fez 40 anos antes. O amargor e o pessimismo são pungentes e um tanto inesperados para um cineasta que produz tanto e já experimentou com tantos formatos. Ele foi o único que, assim como Godard em 1982, se utilizou de todo o tempo disponível para a resposta. O lampejo de esperança que ele lança sobre as gerações futuras de cineastas soa agridoce.
Ao todo, 23 cineastas falam sobre como veem o futuro do cinema e, como há 40 anos, algumas respostas duram vários minutos, outras poucos segundos. É particularmente agradável para nós ver que, assim como Ana Carolina participou do primeiro, Kleber Mendonça participa deste, contextualizando sua resposta à realidade brasileira, onde a teledramaturgia moldou o olhar do brasileiro. As visões variam desde a percepção mais imediata da realidade pós covid, cinema vazios e predominância dos streamings. Mas houve também visões mais práticas, sobre como o preço dos ingressos tornou a sala de cinema uma diversão familiar de elite, enquanto Audrey Diwan destaca que suas filhas jamais teriam paciência de ver seus filmes por suas capacidades de atenção de poucos minutos terem sido moldadas pelos "reels". São poucas as visões otimistas também espelhando a experiência anterior.
O mais fascinante de refazer essa experiência neste momento histórico do audiovisual é que estamos imersos nele. Ver hoje o que cineastas esperavam do cinema, com medo ou esperança, em 1982 com os olhos de hoje, sabendo o que saiu ou não como previsto, é uma coisa. Ver os medos e esperanças de hoje, vivendo as mesmas dúvidas que eles, traz a apreensão que, agora, é compartilhada, como foi para o público de 1982.
COTAÇÃO:
ROOM 999 (França - 2023)
Direção: Lubna Playoust
Fotografia: Marine Atlan
Montagem: Nicolás Longinotti
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