terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

Os filmes do Oscar: O ARTISTA DO DESASTRE - uma indicação


Por Ricky Nobre


Aqui no Brasil a maioria das pessoas não tem noção de que existe um fenômeno cult chamado The Room (2003). Realizado por Tommy Wiseau, diretor/ator/roteirista de primeira viagem e uma figura bizarra, o filme tornou-se famoso em sessões especiais por ser, provavelmente, o pior filme já feito, onde cada cena se torna motivo de descontroladas gargalhadas, se você tiver estômago e o senso de humor adequado, é claro. Ainda que tivesse arrecadado menos de dois mil dólares em seu lançamento, The Room acabou dando lucro ao se tornar cult. Em 2013, Greg Sestero, amigo e companheiro de cena de Wiseau, lançou um livro contando como tal excrecência pôde ser realizada e como ela conseguiu fãs de verdade. 


Também desconhecido do grande público é o fato do ator James Franco ter uma filmografia impressionantemente extensa como diretor, realizando até cinco projetos em um único ano, dentre longa-metragens, séries e filmes de TV e documentários. Franco, fã de The Room de longa data, dirige a atua (igualzinho ao Wiseau...) nesta adaptação que conta a saga de como pessoas que não sabiam absolutamente nada de cinema fizeram um filme que, do jeito dele, é inesquecível.


O Artista do Desastre não poderia ser outra coisa senão uma comédia. Como todo filme “baseado em fatos reais”, existe uma boa dose de adaptação, porém justamente o que o filme tem de mais bizarro e hilário é também o mais próximo da realidade. James Franco triunfa não apenas em sua perfeita caracterização de Wiseau, mas também em criar o tom do filme que também é o tom dos protagonistas: algo que transita entre a ingenuidade, a pureza e a estupidez, tudo num clima de vago porém constante constrangimento. É interessante e funcional a ideia de fazer Sestero (Dave Franco, irmão de James) o protagonista central, pois há tanta névoa no passado e na persona de Wiseau que praticamente inviabiliza a narrativa ser centrada nele.


Ele cria uma sensação de realidade, de que algo como aquilo é capaz de acontecer, partindo justamente do oposto: do absurdo e da mentira. Wiseau, com fortíssimo sotaque do leste europeu, insistia de que era americano de Nova Orleans. Nunca ninguém soube de onde vinha a enorme quantidade de dinheiro que ele tinha para desperdiçar fazendo coisas que a produção do filme não necessitava, como recriar um beco em estúdio, sendo que filmavam ao lado de um beco real, ou o telhado feito em estúdio com fundo verde quando tinham telhados disponíveis para filmar com paisagem real, sem precisar de uma pós produção cara para completar as cenas. 


Franco recriou cerca de 20 minutos de cenas de The Room com fidelidade exata, deixando claro que este foi um trabalho apaixonado. Lembrando Ed Wood de Tim Burton, o filme se equilibra na corda bamba de expor alguém sem talento fazendo cinema da pior qualidade ao mesmo tempo em que deixa clara sua paixão em fazê-lo. O filme com certeza teria mais indicações ao Oscar, na esteira do Globo de Ouro, onde Franco levou o prêmio de melhor ator em comédia. Porém, com as acusações de assédio e abuso sexual que vieram logo em seguida, a Academia se limitou a um indicação pelo roteiro (que não é de Franco). Não deixa de ser bizarro saber de que Franco é acusado de passar dos limites ao ensaiar cenas com jovens alunas em seu curso de interpretação e ver a sequência onde Wiseau faz a mesma coisa no set de The Room. O Artista do Desastre parece espelhar mais a realidade do que pretendia...


COTAÇÃO: 

 
O ARTISTA DO DESASTRE (The Disaster Artist, 2017)
Com: James Franco, Dave Franco, Seth Rogen, Ari Graynor, Alison Brie e Zac Efron.
Direção: James Franco
Roteiro: Scott Neustadter & Michael H. Weber
Fotografia: Brandon Trost
Montagem: Stacey Schroeder
Música: Dave Porter

INDICAÇÃO AO OSCAR:
Roteiro: Scott Neustadter & Michael H. Weber

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