O sueco Ruben Östlund é um dos maiores nomes do cinema europeu recente. Adorado em Cannes, onde seus quatro longa-metragens saíram premiados, chega à sua segunda indicação ao Oscar, após The Square para filme estrangeiro em 2017, desta vez na categoria melhor filme. Seu estilo sempre foi controverso, mas Triângulo da Tristeza é provavelmente seu filme mais divisivo, um autêntico “ame ou odeie”.
Dividido em três partes, o filme começa apresentando seus protagonistas, o casal de modelos Yaya e Carl. Uma longa e aparentemente tola discussão sobre uma conta de restaurante se estende não só por toda essa parte mas até meados da segunda, e estabelece um tom que parecia ser o que o diretor seguiria. Os diálogos são construídos num tom um tanto realista, mas também com uma certa confusão proposital, e o mérito da questão não fica óbvio, assim como também não parece óbvio um julgamento moral sobre cada um dos personagens (por vezes ele parece ser apenas um cara insuportável, enquanto ela chega a admitir que é manipuladora). É uma discussão que não só trata de convenções de gênero, mas também sobre dinheiro e poder. Temos a impressão de que o caminho de Östlund não será o da obviedade. Mas não eram bem esses os planos do diretor.
Podemos conjecturar que o desfile caótico de obviedades que se amontoam no segundo ato é parte da crítica do diretor, algo na linha de criticar a superficialidade sendo superficial. É possível relembrar aqui toda uma produção teórica sobre cinema e sobre arte em geral que problematiza a intencionalidade, mas podemos ficar só com o ditado popular que diz que delas o inferno está cheio. O roteiro ainda mostra boas ideias, mas elas são literalmente afogadas em escatologia, numa epidemia de vômitos e esgotos explosivos, porque cobrir a elite de dejetos foi a forma mais inteligente e profunda que o Östlund encontrou para mostrar como ela realmente é. Daí é um efeito dominó de superficialidades (os diálogos entre o capitão e o milionário russo nunca atinge sua potencialidade), até um corte brusco para o terceiro ato.
E é nesta terceira parte, para a qual parece haver um estranho consenso de ser a mais fraca do filme, que Östlund consegue dar uma salvada nesse naufrágio e abre umas questões e as desenvolve de forma um pouco menos tola (mas pouco, bem pouco), a partir do momento em que as relações de poder se invertem. O desfecho em aberto talvez coloque a questão mais relevante e ousada do filme, onde ele propõe que o poder corrompe inexoravelmente ou que o retorno da classe trabalhadora que se libertou da opressão à sua antiga condição é rigorosamente inaceitável. No saldo final, porém, a crítica social de Triângulo da Tristeza tem a profundidade de um garoto de 15 anos xingando muito no Twitter. Dá até vontade de rever O Mordomo e a Dama (1957), a genial comédia britânica de Lewis Gilbert. Tem luta de classes, desconstrução da elite, utopia, desilusão, naufrágio e ilha. E tem inteligência também.
COTAÇÂO:
INDICAÇÕES AO OSCAR:
Melhor filme
Direção: Ruben Östlund
Roteiro original: Ruben Östlund
TRIÂNGULO DA TRISTEZA (Triangle of Sadness – 2022)
Com: Charlbi Dean, Woody Harrelson, Harris Dickinson, Zlatko Buric, Dolly De Leon, Alicia Eriksson e Carolina Gynning.
Direção e roteiro: Ruben Östlund
Fotografia: Fredrik Wenzel
Montagem: Mikel Cee Karlsson e Ruben Östlund
Design de produção: Josefin Åsberg
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