sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

Adeus, Lobinha... Alcateia se despede de Anny Lucard

Ontem, quando escrevi e publiquei a matéria do filme A Viúva das Sombras no Alcateia, passei o dia com uma sensação de contentamento enorme. Escrevo diversas matérias, mas essa, por algum motivo, me deixou feliz, com uma estranha sensação de realização. Então hoje recebi a notícia de que nossa amiga e loba do Alcateia Anny Lucard, especialista em filmes e livros de terror, fez a passagem ontem.

Subitamente, a sensação que tive ontem me remeteu a ela, de quem também lembrei, talvez por causa do tema, favorito da loba. Nossa Anny partiu, mas ontem eu a senti tão perto, que a sensação de injustiça bateu. Foi cedo demais, não tivemos tempo e agora só fica essa tristeza. Ela era jornalista e sempre nos apoiou. Fazia matérias sobre nossos livros nos diversos veículos onde trabalhou, além de publicar resenhas em seu blog Contos Sobrenaturais. Ela acompanhou tanto o Alcateia que se tornou uma loba e colaborou com diversas matérias. Sempre vou me lembrar do sorrisão e da alegria das cabines de imprensa. Ainda não pudemos voltar presencialmente por conta da pandemia, mas imagino que quando voltar, vou sempre olhar e te procurar. Mas tudo bem! O tempo é nosso amigo. Um dia, vamos nos reencontrar e falar sobre os filmes e livros de terror! Ah, sim! Eu ainda vou reclamar se você rir nas cenas tensas do filme! Mas vou estar lá ao seu lado.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

A FLORESTA SINISTRA QUE COMIA PESSOAS NUAS

 Por Eddie Van Feu

Dedico essa matéria à amiga Anny Lucard. Que possamos um dia nos reencontrar.




Assombrada por uma lenda, uma floresta nas imediações de Saint Petersburgo dá trabalho para uma equipe de resgate. Quem passa por ela sente arrepios, como se alguém o observasse a alguns passos. Outros não têm tanta sorte. Vão e não voltam e são encontrados mortos, sem roupas e sem nenhum indício de morte violenta. Esse é o pano de fundo do filme russo A Viúva das Sombras, que acompanha uma equipe de resgate e uma documentarista quando um adolescente desaparece.

Pode me julgar, mas eu adoro ver filmes que não são do mainstream. Já vi filmes nigerianos, poloneses, russos, sérvios e, claro, coreanos e franceses, que já podem ser considerados mainstream. A versão que eu vi, distribuída pela Paris Filmes, estava dublada em inglês, o que não fez muito sentido, mas ao menos estava bem dublada. Então, vamos ao filme e ao que eu achei dele.

Relatos de pessoas que tiveram que passar pela floresta ou que perderam entes queridos em circunstâncias misteriosas dão início à história, atiçando a curiosidade. E então somos apresentados aos personagens centrais, uma equipe de resgate experiente que está treinando uma novata, ao mesmo tempo em que recebem uma documentarista que filma tudo que acontece. A semelhança com A Bruxa de Blair é impossível de não ser notada, com cenas filmadas por câmeras nervosas e amadoras. Mas, esse é só o começo, e a seguir o filme perde essa característica documental. O que pra mim foi um alívio, porque detestei A Bruxa de Blair.

 

Os personagens carecem de interesse. Dois caras normais, uma novata normal, uma jornalista irritante como qualquer um com uma câmera enfiada no nariz de todo mundo. Não é culpa dos atores (que, aliás, não são atores. São socorristas voluntários, para dar mais realidade ao filme). Faltou uma melhor construção dos personagens para que pudéssemos nos importar mais com eles. Um bom texto, algum humor, um pouco de história, tudo isso já ajudaria, mas no final, são apenas pessoas fazendo o seu trabalho e ignorando as inúmeras coisas esquisitas que vão acontecendo. Juntos são mais funcionais. O grupo aqui atua como um personagem mais forte do que cada um deles em separado. Agora, nenhum personagem é tão marcante quanto a floresta. Sim, a floresta atua como um personagem a parte, iludindo, ameaçando, ocultando. Enquanto acompanhamos o carro do resgate por uma estrada apertadinha e cercada de árvores por todos os lados temos a sensação claustrofóbica de querer sair daquele lugar o mais rápido possível, o que é amplicado pela trilha sonora.

Esses são os melhores pontos do filme. Alguns erros clássicos do gênero estão presentes, além de clichês que não funcionam. Por exemplo, o que mais intriga num filme de terror são três perguntas:

- O que ou quem está causando isso?

- Por quê?

- Como podemos neutralizá-la ou escapar dela?

Quando se responde as duas primeiras muito cedo, perde-se muito do interesse, pois o mistério já foi resolvido. E A Viúva das Sombras faz isso da pior maneira possível. Um personagem aparece e conta tudo, didaticamente, no primeiro terço do filme. Quanto à terceira pergunta, ela nem é feita, o que também é um erro. Os personagens ignoram o que está acontecendo, mesmo sendo óbvio, até ser tarde demais. Nenhum deles tem alguma atitude para tentar resolver o problema. Tudo bem que podemos imaginar que nem todo mundo assiste filmes de terror e acredita em fantasmas, mas pelo menos um deveria ter acionado o desconfiômetro.

 

Outro erro clássico desse gênero que encontramos aqui é a falta de recursos que os personagens possuem para lidar com o vilão. Ninguém sabe o que fazer, nunca. Todas as escolhas erradas são tomadas o tempo todo, como o clássico “Vamos nos separar!”, que qualquer um que tenha visto Scooby Doo sabe que não funciona (especialmente numa floresta assombrada, de noite, no escuro). Aliado a isso, temos o maior dos erros do filme: a vilã mal construída.

A história da Viúva que dá título à obra é desnutrida, anêmica, não empolga nem convence. O poder dela é grande demais, e totalmente inexplicável. Como no nacional Cidade Invisível (que também comete esse erro), ela chega a possuir dois seres ao mesmo tempo sem nenhum esforço. É poder demais para um vilão que não se explica. Com essas falhas, a vilã não se sustenta e filme com vilão fraco tende a não empolgar.

Apesar disso, temos ótimas sequências de suspense, que me fizeram ficar quietinha roendo as unhas esperando o que ia acontecer. Algumas dessas cenas foram atrapalhadas por clichês, ou por atitudes pouco inteligentes dos personagens. No final, a gente começa a se questionar como essa história pode ter sido baseada em fatos reais se nada foi encontrado na internet. Nenhuma filmagem, nenhum depoimento, nadica. Procurei em três línguas, menos em russo que aí já é pedir demais. Não encontrei absolutamente nada referente a fantasmas, assombrações ou corpos encontrados, nus ou vestidos, na Floresta de Saint Petersburg (embora eu tenha encontrado um interessante caso do fantasma de Stalin na cidade).

Acredito que a ideia tenha sido tentar dar uma pegada à lá Bruxa de Blair, que construiu seu sucesso em cima de uma falsa história verdadeira. Com orçamento baixo, poucos atores, uma câmera na mão e uma ideia na cabeça, alguns milhares de dólares foram para o bolso dos responsáveis. A Bruxa de Blair nunca me convenceu, ou assustou, ou instigou. Acho que nem terminei o filme. Já A Viúva das Sombras conseguiu me dar uma boa dose de suspense e um alívio de não estar nem perto daquela floresta claustrofóbica.