Por Ricky Nobre
Já foi o tempo que os desamparados e aflitos nerds sentiam um misto de euforia e pavor toda vez que ouviam que seu personagem de quadrinhos favorito ia ser adaptado para o cinema. Tá, cada anúncio de diretores, roteiristas e atores ligados a um determinado personagem aumenta a acidez estomacal dos fãs, mas, felizmente, os tempos de Batman e Robin já passaram. Hoje temos um panorama diferente, mas que, de forma curiosa, apesar de muito melhor, é também um problema, ainda que de forma inversa. Ótimos filmes como Homem Aranha, X-Men (o segundo principalmente) elevaram bastante o nível de exigência. Quando, em 2008, chegou O Cavaleiro das Trevas, o padrão foi elevado a tal nível que equipará-lo se tornou tarefa para poucos. Muito poucos.
Mas nem todo filme precisa ser uma profunda análise psico-sociológica como a obra-prima de Christopher Nolan sobre o morcegão e o palhaço. Dá pra ser um empolgante filme de super herói, fiel às origens, extremamente bem produzido e divertido pra dedéu. E foi isso que, no mesmo ano, entregou Jon Favreau com O Homem de Ferro. O filme marcou a estréia da Marvel como produtora de cinema e fazia parte de um grande plano, que incluía diversos filmes de seus principais personagens (os que não estavam nas mãos de outros estúdios, sejamos claros) com o ápice atingido com um filme dos Vingadores, que reuniria os personagens dos demais filmes (Homem de Ferro, Hulk, Thor e Capitão America). Para a Marvel, a estréia foi tão arrasadora que uma continuação foi anunciada, mesmo não estando nos planos iniciais, principalmente pelo fato de O Incrível Hulk não ter tido o resultado esperado. A volta de Tony Stark, surpreendentemente, um dos heróis mais carismáticos dos filmes de heróis, era ansiosamente aguardada.
Todos os vilões caídos na foto acima escorregaram na própria baba.
De início, o segundo filme encarava uma grande dificuldade. Geralmente, continuações de filmes de super heróis têm a vantagem de não precisar perder tempo narrando a obrigatória origem. No caso do Homem de Ferro, essa origem foi tão bem narrada e tão fiel à história original que se tornou um dos pontos altos, senão o mais alto do filme. A continuação, portanto, necessitaria de algo tão bom quanto para prender o público como o primeiro. Foi anunciado, assim que o primeiro filme estourou e a Marvel decidiu pela continuação, que ela trataria do alcoolismo do protagonista. Não foi o que aconteceu. E pode parecer exagero ou frescura, mas esse é, provavelmente, o grande problema de O Homem de Ferro 2.
Alguém acredita que Mickey Rourke já foi galã?
Objetivamente, o grande problema parece ter sido a substituição do excelente time de quatro roteiristas responsável pelo primeiro filme, pelo ator Justin Theroux, cujo único credito por roteiro foi no recente Trovão Tropical, uma comédia hardcore no estilo ame-ou-odeie. Theroux acertou nos diálogos de Stark, dando chance a Dowey Jr. de brilhar como no filme anterior, com frases antológicas como “eu privatizei a paz mundial com sucesso.” Mas a estrutura do roteiro é falha, muito provavelmente por ter sido emendada. A ausência do vício de Stark é coberta com uma trama envolvendo o envenenamento pelo paládio contido no reator da armadura. Uma cena de bebedeira permaneceu, mas não proveniente do vício, mas sim do medo da morte eminente.
Fica constrangedoramente claro que a trama do alcoolismo foi retirada após o roteiro ser escrito e substituída pela trama do paládio. A porção central do filme, meio parada, poderia ter sido bem mais dramática com a história original. Teria a Paramount vetado a possibilidade de um herói alcoólatra? Isso poria por terra a comemorada independência da Marvel ao se tornar um estúdio.
O vilão também é um problema, como era de se esperar, pois o Homem de Ferro nunca teve vilões memoráveis. Aqui, chegaram a misturar dois vilões, Crimson Dynamo e Whiplash, pra ver se funcionava. Mickey Rourke até se sai bem, mas a luta final ficou longe de ser verdadeiramente climática. Foi usado também Justin Hammer, o financiador de vilões, de forma convincente. É bom ver Nick Fury em participação de maior destaque, e Scarlet Johansson está suculenta de Viúva Negra (que, aliás, nunca chega a ser chamada por esse nome). Há boas citações a diversas armaduras dos quadrinhos, como a vermelha e prata, apresentada como a versão portátil (armadura da mala).
Homem de Ferro 2 é um filme divertido, mas bem inferior ao antecessor. Já arrecadou 420 milhões de dólares, então foi anunciado o terceiro filme, a ser lançado em 2012, junto com Os Vingadores (e um suposto filme do Nick Fury). Vamos esperar que o Thor que Kenneth Branagh e o Capitão América de Joe (aham) Johnston sejam mais corajosos e bem escritos. Do contrário, o primeiro Homem de Ferro permanecerá sendo o único grande acerto da Marvel como estúdio de cinema.
NOTA: 3/5