quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

Les Misérables School Edition: Garotada Fazendo Trabalho de Gente Grande

Por Eddie Van Feu

 

A história contada por Vitor Hugo representando uma sociedade em colapso de fome e pobreza do século XIX ressurge com um elenco jovem e uma amarga sensação de familiaridade com o tempo presente.

 


Se você não leu o livro homônimo de Vitor Hugo, certamente já viu ou ouviu falar do musical da Broadway que vem se tornando um dos maiores sucessos na história dos musicais ao longo de sua carreira. No Brasil, tivemos a montagem oficial em São Paulo em 2001, que eu nunca me perdoei por perder, pois estava em São Paulo nessa época trabalhando nos eventos de anime, vendendo nossos mangás e tudo o mais. Felizmente, em 2017 eu tive uma nova oportunidade e me emocionei com a beleza e perfeição do espetáculo de quase três horas. Fiquei imaginando quando poderia ver de novo. Me contentei revendo o filme e a mini série com Gerard Depardier.

E numa surpresa boa (porque parece que somos constantemente alvejados no Rio com surpresas ruins), descubro que Les Mis está no Rio! Não a versão oficial, mas a versão teen. Com um orçamento mais modesto, a mesma letra em Português de Cláudio Botelho, Les Mis chega com uma nova geração para contar uma história eterna.

A duração é menor e há um intervalo para quem precisar fazer um rápido xixi ou esticar as costas. Fiquei imaginando quais músicas não entrariam para que a versão carioca fosse mais curta. A resposta é NENHUMA! Todas as canções estão lá, interpretadas com todo o talento que se pode esperar. O que a torna mais curta são cenas que foram simplificadas e tornadas mais ágeis, por falta dos recursos pirotécnicos que a versão de São Paulo oferecia.

Mas que isso não desanime o espectador! Deixe-me contar um pouco mais para você saber o que esperar.



Apesar da foto emblemática que representa o musical ser a menininha Cosette, a história começa e termina com Jean Valjean, homem que cumpre uma pena cruel por ter roubado um pão para o filho pequeno da irmã. Estamos numa França pós Revolução que não mudou muito. Seus miseráveis continuam trabalhando em condições inumanas, por migalhas que não conseguem sustentá-los. A Lei, dura e cega, é representada pelo oficial Javert, que não vê nada além da lei que deve cumprir. É ele quem presencia Jean Valjean quando este cumpre sua pena e o sentencia a nunca ser nada mais do que um ladrão. Valjean não cumpre essa profecia e se torna muito mais. No meio disso tudo, jovens estudantes sonham com uma revolução que acabará com a injustiça social! Um sonho bonito, cheio de energia, mas sem nenhum projeto real. Jovens se apaixonam, vivem o primeiro amor, vivem o abandono e a solidão.


Isso tudo é cantado, claro! E nesse caso, muito bem cantado! Gabriel Boliclifer encarna o Jean Valjean, e JESUS, MARIA E JOSÉ!!! QUE VOZ É ESSA??? Límpida, sem um desafino, emocionante, lá fui eu chorar e embaçar os óculos em vários momentos em que esse jovem ator preencheu o palco com sua presença. Não bastasse cantar bem, ele acompanha o personagem com postura e feições, desde de sua forma quase animalesca quando decide se tornar um criminoso, até quando o tempo vai imprimindo sobre ele sua pisada.

Seu perseguidor implacável, Javert, é interpretado por Leornardo Araújo, cuja voz alcança nossa alma e nos dá o entendimento de sua visão de vida. Sua presença de palco é excelente, e convence como o policial determinado a caçar seu fugitivo até o fim dos tempos. Somos apresentados à pobre Fantine, cujo destino miserável dá a direção da história. Sophia Fried tem uma linda voz e é bem comovente, especialmente quando brilha em sua tristeza no clássico I Dreamed a Dream. Outra personagem de história infeliz é a também miserável Eponine, filha do casal de picaretas cômicos, os Thenardier. Eponine é o retrato de todos que já amaram sem ser amados e, sozinhos num sonho triste, deixam que o amor cresça tanto que ver o ser amado feliz se torna o suficiente. Letícia Ballard tem um jeito de menina faceira, malandra, fazendo com que Marius nem perceba a beleza que ela esconde e o amor que ela nutre. Marius (Eric Daumas) é o jovem apaixonado que se divide entre viver a revolução ou viver um grande amor. Ambos são talentosos e cantam bem, considerando que estão apenas no começo de suas carreiras. Enjolras, interpretado por Enzo Campeão, é o jovem líder da revolução. Sua voz não possui tanto alcance, mas o talento está lá e ele me convenveu a lutar com ele. Só não subi no palco para pegar em armas ao lado dele porque os seguranças não deixaram. Cosette adulta é interpretada por Danielly Ruf, que não bastasse ser uma princesa no palco, tem uma voz de sereia que não desafina uma única vez.

E ainda temos os pequenos Gavrauche e a pequena Cosette. Lia Campos empresta a Gavrauche a malandragem das ruas e seu jeito destemido, enquanto a pequena Cosette na pele de Alice Pinheiro canta seu sonho com um castelo onde não precise varrer o chão e possa ser amada. Dá vontade de levar os dois pra casa!

Cereja do bolo é o casal de Thenardier, que são detestáveis, mas ao mesmo tempo, engraçados, graças à interpretação de Matheus Ananias e Elisa Toledo, que dão personalidade e graça aos seus personagens.

Alguns dos atores se repetem em outros papéis menores, enquanto temos também miseráveis, estudantes, prostitutas, mães em luto, guardas e clientes da taberna, sem os quais a peça não teria brilho nem cor. Cada um se doou ao seu personagem, e isso ficou claro nas pequenas ações, como no bocejo da revolucionária de vigia na barricada e as palavras duras da prostituta que Fantine encontra. O cenário, cru e em madeira, simples e direto ao mostrar a pobreza onde a maioria dos personagens vive, é o pano de fundo para que vejamos tudo acontecer.

A peça tem direção de Menelick de Carvalho, direção musical de Claudia Elizeu e preparação vocal de Léo Wagner, que já foi Jean Valjean no Brasil, onde se destacou tanto que foi convidado a fazer o mesmo papel na versão mexicana. São essas pessoas que tornaram esse projeto viável, colocaram esses jovens no palco e os ajudaram a brilhar.

O elenco pode mudar nos dias de apresentação, pois há uma alternância de papéis para que mais pessoas tenham oportunidade de mostrar seu talento, o que é uma ótima ideia.

Ao fim da peça, o elenco vende rifa e copos comemorativos para ajudar a pagar a produção. Tenho meu copo dos Miseráveis e estou feliz!

 

‘Les Misérables School Edition’ terá sessões em diferentes datas durante dezembro. Estreando no dia 3 (sexta-feira) às 20h, dia 5 (domingo) às 18h, dia 8 (quarta-feira) às 16h, dia 18 (sábado) às 16h e 20h, dia 21 (terça-feira) às 16 e 20h e finaliza a temporada no dia 22 (quarta-feira) com sessões às 16h e 20h.

Os ingressos estão à venda pelo https://bileto.sympla.com.br/event/70234/d/116334

Serviço
Local: Teatro Prudential
Rua do Russel, Glória, 804, Rio de Janeiro
Ingressos a partir de R$ 25
Temporada:até 22 de dezembro
Dias: Dia 8 (quarta-feira) às 16h, Dia 18 (sábado) às 16h e 20h, Dia 21 (terça-feira) às 16 e 20h, Dia 22 (quarta-feira) com sessões às 16h e 20h.

Duração: 150 min
Classificação etária: 12 anos

Ficha Técnica
Texto, músicas e letra original: Bolbill e Schonberg
Baseado no romance Les Misérables de Victor Hugo
Versão Brasileira: Cláudio Botelho
Direção geral: Menelick de Carvalho
Assistente de Direção: Vitor Louzada
Direção Musical: Claudia Elizeu
Assistência de Direção Musical: Sulamita Lage
Preparação Vocal: Léo Wagner
Preparação de Atores e Coordenação Pedagógica: Reiner Tenente
Direção de Produção: Joana Mendes
Produção Executiva: Duda Salles
Cenário e figurino: Nícolas Gonçalves, Jovanna Souza,Rebecca Cardoso, Gabriel Boliclifer e Luisa Rossi

Elenco: Letícia Ballard, Nico Leão, Julia Vilhena, Thaíssa Aceti, Sophia Fried, Sidarta Senna, Laura Rabello, Cecilia Diniz, Fernanda Bicudo, Matheus Ananias, Lia Campos, Ísis Câmara, Eric Daumas, Luísa Rossi, Juliana Queiroz, Enzo Campeão, Tereza Neves, Leonardo Araújo, Dani Ruf, Gabriel Boliclifer, Alice Pinheiro, Mariana Magalhães, Maria Luisa Amado, Elisa Toledo.