domingo, 15 de outubro de 2023

ALCATEIA NO FESTIVAL DO RIO 2023: DIA 11/10

Por Ricky Nobre

 

FILME 10: TÓTEM

É muito difícil para um latino americano assistir Tótem e não se sentir como se estivesse em casa. Em seu segundo longa-metragem, a cineasta mexicana Lila Avilés reúne uma extensa família na casa onde será comemorado o aniversário do jovem pintor Tona, pai da pequena Sol. A menina observa todos os preparativos para a festa, enquanto tem dificuldade em entender porque não pode ver o pai, achando que ele não gosta mais dela. Entre tias, primos e avós, o público é abraçado pela dinâmica familiar de amor, cooperação, risos, brigas e tristezas.

Conforme o filme avança e a festa acontece, fica dolorosamente claro que, mais que uma festa de aniversário, é uma festa de despedida de um jovem pai que sofre de um câncer terminal. É evidente o quanto que, naquele ambiente familiar, todo o trabalho, seja de cuidado, seja para a festa, é feito por mulheres, que formam a grande maioria de um elenco que tem uma dinâmica impecável, principalmente as adoráveis crianças. 

 

É comum que filmes fora do grande circuito comercial se utilizem da janela 1,33:1 para dar uma sensação de confinamento, de claustrofobia. Avilés, porém, utiliza do formato de forma totalmente diferente. Tótem é um filme tão profundamente íntimo pela forma como a câmera enquadra, sempre na mão e muito próxima. O close é quase a regra de enquadramento aqui e, ao mesmo tempo em que a tela diminuta e quase quadrada reúne todos os elementos de cena de forma aconchegante, ele também possibilita o perfeito enquadramento dos rostos, que sempre observam, sentem e se expressam.

 

Tudo em Tótem é absoluta e sinceramente genuíno, desde o pai que não sabe como falar com o filho doente até a irmã que insiste em uma demoradíssima decoração de bolo para não ter que lidar com a frágil presença do irmão na festa. Sol, que só quer o amor do pai, observa a tudo e, de alguma forma, absorve o que sua idade permite. A última cena, simplesmente assombrosa, assalta a mente e os sentidos e, mais que significado, possui um poder esmagador, quase místico. 

COTAÇÃO:


 

TOTÉM (México, 2023)

Com: Naíma Sentíes, Montserrat Marañon, Marisol Gasé, Saori Gurza, Mateo Garcia, Teresa Sánchez e Iazua Larios

Direção e roteiro: Lila Avilés

Fotografia: Diego Tenorio

Montagem: Omar Guzmán

Música: Thomas Becka

 

FILME 11: UMA FAMÍLIA NORMAL

O livro O Jantar, de Herman Koch, já foi filmado três vezes, na Holanda, Itália e EUA. Esta produção sul coreana, porém, expande o desenvolvimento do conflito ao sair do cenário único do jantar e se espalhar pelo dia a dia dos personagens. O diretor Jin-ho Hur é hábil nesse jogo de dúvidas e embates éticos e morais. Desta forma, se estabelece uma clara definição de cada personagem, que vão lentamente se modificando e/ou se revelando conforme os fatos vão se desenrolando e desvendando.

Ao iniciar definindo o conflito entre os dois irmãos, o advogado frio e o médico humanista, o filme vai pondo à prova o caráter e as convicções de cada um a partir da principal indagação:  vale tudo para proteger os filhos? O filme não envereda em argumentos sobre uma possível dessensibilização das novas gerações diante da violência, preferindo, a partir da atuação dos personagens na trama e dos próprios ambientes (como o restaurante suntuoso, quase privê), discutir privilégio de classe.

 

Jin-ho Hur mantém um clima de mistério que é menos em serviço de um suspense que engaje o público (embora o faça) do que da disputa moral entre os personagens, intensificando o melodrama, à medida em que, diante da verdade incontornável, a discussão passa a ser sobre qual filho é mais culpado que o outro. O jogo de poder, onde a vida de um morador de rua tem muito menos valor do que o futuro de jovens da pequena burguesia, se transfere, então, para uma dinâmica de disputa familiar, e limites seguem sendo postos à prova.

COTAÇÃO:


 

UMA FAMÍLIA NORMAL (Bo-tong-ui ga-jog, Coréia do Sul – 2023)

Com: Sol Kyung-gu, Jang Dong-Gun, Kim Hee-ae e Claudia Kim

Direção: Jin-ho Hur

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