segunda-feira, 24 de abril de 2017

OS GUARDIÕES DA GALÁXIA VOL. 2: Escracho e emoções cósmicas


Por Ricky Nobre


Quando Guardiões da Galáxia foi lançado em 2014, todo mundo foi pego de surpresa. Após vários sucessos com os heróis mais conhecidos da Marvel (os que ela ainda tinha os direitos, na verdade), o estúdio resolveu apostar num grupo de personagens pouco conhecido até mesmo para alguns leitores de quadrinhos. O estrondoso sucesso dava a impressão de que a Marvel era capaz de qualquer coisa (menos fazer um bom filme do Thor). Com muito (muito!) humor, referências ao século XX, ação, música, cor e (finalmente!) personagens do universo cósmico da editora, Guardiões da Galáxia provou também ser capaz de momentos ternos e emocionais que não eram estragados por uma piada fora de hora (“We are Groot”). O sucesso foi tamanho que rapidamente outros estúdios tentaram entender a dinâmica do filme e faturar encima. Quem se lembra do primeiro e estranhíssimo trailer de Star Trek: Sem Fronteiras? O próprio Esquadrão Suicida é uma muito desastrada tentativa de criar um “Guardiões” da DC. A expectativa quanto à continuação é, desnecessário dizer, imensa. Pois, finalmente, os heróis mais estranhos da galáxia voltaram trazendo tudo o que os fãs amaram no primeiro filme; e tudo em enormes e, talvez para alguns, indigestas quantidades. 

 

Desta vez, nossos heróis estão fugindo dos Sovereign, povo que eles acabaram de ajudar, mas Rocket fez algo imbecil. Nessa fuga, acabam encontrando Ego (Kurt Russel, perfeitamente escalado), o verdadeiro pai de Peter Quill. Os Sovereign contratam Yondu e seu bando para achar os guardiões, enquanto Gamora tem que lidar com a irmã Nebula e Peter descobre os segredos e maravilhas por trás de sua herança paterna. 

 

O roteiro e direção de James Gunn traz erros e acertos. O principal problema está, surpreendentemente, no humor. Excesso de humor, principalmente fora de hora, tem sido uma crítica constante aos filmes da Marvel. Guardiões da Galáxia, porém, encontrou uma medida, um ritmo e uma identidade que permitiram um filme carregado de humor, mas que parecia perfeitamente adequado à história, aos personagens e ao clima do filme, não deixando que esse humor invadisse momentos mais dramáticos. Aqui, felizmente, nenhum momento mais sério foi estragado por alguma piada estúpida, mas a primeira metade do filme é tão carregada de piadas ao ponto de algumas cenas terminarem truncadas. Algumas ações, importantes inclusive, chegam a parar para que a piada seja feita, e nem todas são exatamente engraçadas. É muito curioso como isso condiciona parte do público, onde alguns chegam ao ponto de não ver mais graça em nada e outros riem até onde não tem piada. 

 

Na sua segunda metade, o filme começa a se concentrar melhor em si mesmo, e a história flui muitíssimo melhor. Cada personagem tem seu momento, sua própria história, seu próprio conflito com o passado, e fica claro que o tema central do filme é a família, aquela na qual você nasce e a que você escolhe. Apesar do humor, muitas vezes absurdo e escrachado, continuar, ele passa a ser usado de forma mais inteligente e precisa, sem jamais atropelar o drama e a emoção, que, aliás, assumem proporções bastante inesperadas, tanto para o espectador comum, quanto para o “marvete”.

 

Mesmo com as falhas, James Gunn figura entre os cineastas mais inventivos e originais que passaram pela Marvel até agora. Com um belíssimo visual até nos menores detalhes, Gunn mete o pé na jaca dos anos 80, com referências a fliperama (Asteroids®, Pac-Man®...), Hasselhoff e um Kurt Russel rejuvenescido sensacional, além, é claro, das esperadíssimas músicas setentistas do Awesome Mix #2. Até mesmo o tema musical heroico do grupo que Tyler Bates compôs para o primeiro filme e foi subutilizado (como sempre são os temas principais dos filmes da Marvel), desta vez é ouvido constantemente, seja como fanfarra, seja em variações, num trabalho quase 100% sinfônico, como era comum nas trilhas dos anos 80. E na referência musical suprema, esse tema heroico vira versão “disco” estilo Meco nos créditos finais. Sobra referência até de Hitchcock e Tarantino, um verdadeiro exército de personagens do universo cósmico da Marvel, capaz de testar os conhecimentos de qualquer fã, e uma participação de Stan Lee que vai te fazer cair da cadeira! Além, é claro, da infinita fofura do baby Groot!
 


Não se pode deixar de fazer uma importante menção às personagens femininas do filme. Mesmo com tantos homens protagonizando, Gamora, Nebula, Ayesha e Mantis roubam a cena com personagens fortes, bem construídos e sem os clichês estúpidos que tão constantemente são usados com mulheres no cinema. O embate e a relação entre Gamora e Nebula merece particular destaque.

 

Guardiões da Galáxia Vol 2 acaba sendo um filme um tanto desequilibrado em sua forma de lidar com o humor e a emoção. Dependendo de suas expectativas e exigências, seja quanto à Marvel, seja quanto a cinema, você pode acabar se decepcionando ou se irritando com a primeira ou com a segunda metade do filme. Muito provavelmente, seria um filme melhor se ele tivesse casado tão bem humor e drama na primeira parte como fez da segunda. Mas de uma coisa não há dúvida: se quando Cat Stevens cantar você não estiver chorando, você tem um coração de pedra e, pra manter o nível de honestidade de Drax, suas referências musicais fedem! 

 

Guardians of The Galaxy Vol 2

Com: Chris Pratt, Zoe Saldana, Dave Bautista, Vin Diesel, Bradley Cooper, Michael Rooker, Karen Gillan, Pom Klementieff, Kurt Russell, Elizabeth Debicki, Sean Gunn e Sylvester Stallone.

Direção e roteiro: James Gunn

Fotografia: Henry Braham          

Montagem: Fred Raskin e Craig Wood

Música: Tyler Bates

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