quinta-feira, 18 de junho de 2009

SPEED RACER brilha (até demais)

por Ricky Nobre



É Speed Racer é um filme sem público. É preciso ter assistido ao desenho no Capitão Aza aos três anos de idade para conseguir apreciar as reais qualidades do filme, mas esses mesmos fãs poderão não tolerar seus principais defeitos. Assim, cada um encontrará dentro de si como esses pesos se equilibram. Para todo o resto do mundo... é um filme MUITO estranho.

O primeiro trabalho pós-Matrix dos irmãos Wachowski (V de Vingança foi só escrito e produzido por eles) vem com aquele aval que um estúdio só dá pra quem rendeu verdadeiras fortunas. Do mesmo jeito que a New Line deu carta branca artística e financeira para Peter Jackson fazer qualquer coisa que lhe desse na telha depois da mina de ouro chamada Senhor dos Anéis (e daí saiu King Kong), Speed Racer é fruto desta confiança cega da Warner nos irmãos. A apreciação dos dois por animes já era totalmente evidente em Matrix, seja pela coreografia estilizada das lutas, seja pela própria produção da série animada Animatrix, onde cinco dos sete episódios eram japoneses. Apesar da grande decepção que Matrix se tornou com as continuações, ter um dos mais icônicos animes adaptado por eles, não seria má idéia. Muito se especulou sobre qual o caminho tomado, até que saiu o primeiro trailer. Muita gente já começava a quicar.

O filme, na verdade, surpreende. Numa decisão incrivelmente enriquecedora para o filme, os Wachowski não emburreceram a narrativa, muito pelo contrário. Ela é sofisticada ao ponto de pôr em risco a conquista do público infantil, que pode ter sérios problemas em seguir a constante não-linearidade na qual a história transcorre, com constantes flashbacks entrecortados, flash-fowards e até cenas simultâneas entre presente e passado. Uma grata surpresa que nos faz lembrar o talento que os diretores apresentavam no início da carreira.

O roteiro equilibra muito bem o simplismo necessário a uma história de Speed Racer, com uma elaboração bastante razoável da trama, com algumas boas surpresas. O investimento emocional na jornada dos personagens dá profundidade e credibilidade a uma história que se passa toda numa realidade absurda, onde corridas de carros são quase espetáculos de luta livre. O elenco perfeito ajuda muito a tornar esse investimento um sucesso, pois os personagens estão perfeitamente adaptados (Gorducho é simplesmente impagável). O elo mais fraco é justamente Speed, não porque o jovem Emile Hirsh esteja mal, mas todos os outros estão bem demais. Todos falam como as vozes (americanas, claro) do desenho, sem caricaturizar ao ponto de arruinar o texto, trazendo ainda mais charme em sua contribuição para a absoluta estilização do filme.



Então o filme é um absoluto sucesso!! Err... não. Um único aspecto é capaz de levar o filme por água abaixo, dependendo do quanto te irrite. As corridas são um desastre. É uma enxurrada tão absurda e desproporcional de luzes, cores e movimento, nas imagens mais indutoras de epilepsia já criadas! Tudo brilha como uma superfície metálica, ou até mesmo plástica, e texturas estão ausentes até mesmo das pistas. Nenhum carro parece andar em linha reta, deslizando constantemente de lado, no que na cabeça maluca dos animadores (tudo ali é digital) deveriam ser derrapagens. Não que os indizíveis absurdos das corridas sejam ruins em si, pois, do contrário, não seria fiel ao desenho, mas espera-se, pelo menos, que as pistas pareçam pistas e que os carros andem pra frente. Salva-se, com louvor, o rali, que atravessa desertos e montanhas, evocando com perfeição as grandes corridas do desenho. A presença do Mach 6 na última corrida também vai desagradar os mais conservadores, além da overdose high tech onipresente, num amálgama, sem sempre bem sucedido, com visual retrô.
Se as corridas em pista incomodam tanto, o final do filme acaba sendo um grande anti-clímax, quando todos os defeitos decidem se reunir numa única seqüência para caçoar do público pagante. Numa tentativa de se aproximar do público jovem que não via o desenho há 40 anos, os Wachowski acabaram transformando as corridas num grande videogame tão insípido quanto ultrapassado (nem os games de hoje parecem tão falsos). Por outro lado, esse público que não cresceu amando o desenho deve acabar achando todo o conjunto uma imensa bobagem.



No filme, Speed Racer tem a cara dos Wachowski, para bem e para mal, com todas as boas e más surpresas às quais eles já nos acostumaram. Se você é fã, encha seu coraçãozinho de amor e vá ver, que tem MUITA coisa boa ali. Se não for, é melhor ir ver Homem de Ferro.

NOTA: 3/5

Ricky Nobre brincava de Speed Racer com seus carrinhos de ferro e notou perturbadora semelhança entre seus brinquedos e os carros em GCI...

Ficha Técnica: Speed Racer
EUA, 2008, 135 min
Direção e Roteiro: Andy Wachowski & Larry Wachowski
Elenco: Emile Hirsch, Susan Sarandon, John Goodman, Christina Ricci, Matthew Fox.

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