ATENÇÃO: OS TEXTOS DESTA SÉRIE SOBRE STAR WARS CONTÉM SPOILERS!!!
Peço licença para iniciar este post da mesma forma que o anterior. Pois, definitivamente, não existe forma de dizer isso que não seja direta: O Império Contra Ataca é um filme PERFEITO.
Pensar sobre o Episódio V nos força a um caminho semelhante ao feito no post anterior sobre o quarto episódio, porém numa amplitude mais restrita. Explicando: a dimensão e o impacto deste episódio à época de seu lançamento diferem dessas mesmas características no âmbito de sua apreciação dentro da cronologia da saga. Entretanto, ao contrário do Episódio IV, não difere em qualidade, mas sim no que tange a quais características o tornam... enfim, perfeito.
"A Força é forte com você, jovem Skywalker. Mas você ainda não é um jedi."
"Ajudaria se eu descesse para empurrar?"
"É possível."
"Você gosta de mim porque eu sou um canalha. Não existem muitos canalhas na sua vida".
Toda essa drástica diferença do anterior tem um motivo bem definido. Lucas sofreu muito com a iminência de perder o controle sobre seu filme quando produziu Star Wars, tendo, inclusive, que colocar um milhão de dólares do próprio bolso (que era todo o dinheiro que ele tinha no mundo) para conseguir completar o filme. Quando este se tornou a maior bilheteria de todos os tempos, a Fox logo convidou Lucas a realizar a sequência. Este, porém, estava decidido a não se submeter mais a estúdio algum e a produzir o filme de forma independente e para isso precisava conseguir financiamento bancário. No entanto, este esforço era incompatível com a vultosa tarefa de escrever e dirigir um filme. Com a história pronta, Lucas resolveu contratar um diretor e um roteirista. Irwin Keshner, que foi professor de Lucas na faculdade, assumiu a direção, com toda a sua experiência com filmes mais intimistas e seu talento para direção de atores. Leigh Brackett, renomada escritora de ficção científica, foi contratada para escrever o roteiro sobre a sinopse de Lucas. Ela conseguiu entregar uma primeira versão, porém faleceu logo após devido a um câncer. Lucas não ficou muito satisfeito com o resultado e escreveu mais duas versões. Lucas então passou para o então novato Lawrence Kasdan, que acabara de entregar o roteiro de Caçadores da Arca Perdida, que reescreveu tudo em seis semanas.
"Desculpas aceitas, Capitão Needa".
Sem tirar os inquestionáveis méritos de Lucas com a história e Kershner com a direção, principalmente com os atores, é o ouvido perfeito de Kasdan para diálogos que é o grande segredo do Episódio V. Kershner queria humor, mas que não fosse bobo ou exagerado. Queria romance, mas que não fosse meloso. Kasdan atendeu à perfeição. C3PO nunca foi tão engraçado e, mesmo assim, ele nunca "sobra" no filme. Os diálogos rápidos e afiadíssimos entre Han e Leia lembram as antigas comédias românticas dos anos 50 (com um toque de Billy Wilder). Yoda é um verdadeiro sábio e as palavras que saem da boca da marionete criada, manipulada e interpretada pelo veterano dos muppets Frank Oz soam como verdades cósmicas para o público. Aliás, um tributo honradíssimo deve ser prestado a Oz. Seu Yoda marionete é mais simpático, sábio, crível, sereno e "humano" do que sua contraparte digital nos prequels (que, sejamos justos, ficou muito boa). E o motivo da marionete de Ameaça Fantasma ter ficado tão ruim é um absoluto mistério.
O ritmo é perfeito. A verdade emocional dos personagens é perfeita. O senso de drama é perfeito. A ação é perfeita. A voz de Vader não estava apenas muito melhor equalizada, não dando mais a impressão de vir de dentro de uma lata como no filme anterior, mas de todo lugar, de todo o império, de dentro do seu mais intimo temor do que ele pode fazer com você. James Earl Jones estava perfeitamente dirigido, com os mais perfeitos diálogos, com as atitudes mais assustadoras. Kasdan CRIOU Vader como o conhecemos. Vader não é mais um capanga de luxo. Ele é O vilão mais phoda do cinema! E também não podemos esquecer a extrema ousadia para a época que foi terminar um filme deste porte com um gancho, mais uma vez referenciando os antigos seriados de cinema.
"Pois
minha aliada é a Força, e que poderosa aliada é ela! A vida a cria, a
faz crescer. Sua energia nos envolve e nos une. Seres luminosos nós
somos, não esta rude matéria. Você precisa sentir a Forca em torno de
você."
Voltando à ideia do início do texto, o filme sofre mudanças na percepção que se tem dele ao ser assistido na sequência dos eventos, sob a luz dos prequels. Muitos defendem assistir a saga na ordem de produção para não tirar o impacto da revelação de Vader a Luke. Porém, uma visão mais cuidadosa revela uma contrapartida interessantíssima para quem já começa o filme sabendo do parentesco dos personagens. A expectativa do público é como ele vai descobrir. Ele entende a preocupação de Yoda e Obi-Wan. Ele entende o perigo que é para Luke enfrentar Vader despreparado. Ele percebe a iminência da revelação e se inquieta, fica na ponta da cadeira. Como um recurso hitchcockiano, o público sabe de tudo que o protagonista não sabe e teme por ele, quer gritar para a tela "cuidado, Luke! Ouça Yoda! Você corre grande perigo!". Sem preparo, com tão pouco treinamento, Luke seria presa fácil para o lado negro quando descobrisse a verdade. Mesmo assim, sabe que ele DEVE ir salvar seus amigos. A grande pergunta que inquieta o público é: terá ele o mesmo destino do pai? Não podemos esquecer a absoluta tragédia que foi o desfecho do Episódio III, principalmente para o público que não sabe o que vem adiante. Palpatine deu seu golpe de estado e criou o Império. Todos os jedis foram massacrados. O herói da série foi queimado, mutilado e transformado num quase ciborgue, agora do lado do vilão. O máximo que foi possível salvar foram DOIS jedis e os gêmeos de Padme. Apenas isso! Quando vemos o depressivo final, com Luke com mão decepada e com uma horrenda revelação sobre os ombros, Han Solo congelado e levado até Jabba, o público mais jovem pensa: "ah não, tá acontecendo tudo de novo! Eles vão todos morrer!"
"Luke,
você pode destruir o Imperador. Ele previu isso. É o seu destino.
Una-se a mim e juntos governaremos a galáxia como pai e filho!"
Outra grata surpresa é, mais uma vez, Vader. O Anakin apresentado nos episódios II e III (este último principalmente) é perfeitamente reconhecível. O que foi apenas um relance no episódio IV (veja na resenha anterior sobre a cena da "falta de fé"), aqui é constante. A presença de Anakin é real, assim como seu desejo de trazer o filho para seu lado, dando um golpe no Imperador.
Este foi o filme que menos sofreu com as mudanças do special edition de 1997, que foram, em sua grande maioria, estéticas. Apesar de desnecessárias, em nada atrapalharam. Em 2004, Ian McDiarmid substituiu a esposa do maquiador Rick Baker na breve aparição do Imperador, substituição, honestamente, bem vinda. O diálogo, porém, sofreu ligeira mudança, onde Vader se mostra surpreso com a informação do Imperador de que Luke é filho de Anakin. Pode ser uma alusão ao fato de que no episódio III Vader acredita que o filho morreu com Padme. Mas como Vader já começa o filme numa busca ferrenha por Luke, talvez ele tenha apenas dissimulado, escondendo seu plano de tomar o poder do imperador e assumir Luke como aprendiz. Afinal, é assim que os Sith agem.
Mesmo que no episódio seguinte Lucas tenha escrito junto a Kasdan novamente e outro diretor tenha sido contratado, O Império Contra Ataca é o filme da saga que menos teve participação e decisões diretas de Lucas. E é o mais adorado pelos fãs. É evidente que Lucas não aceita isso muito bem. Seu apego ao ego, a recusa à parceria criativa na criação dos prequels sugerem que ele está mais interessado em ter os méritos do resultado para si (mesmo que sejam ruins) do que garantir a qualidade do trabalho. Afinal, Lucas passou mais de 20 anos apenas atuando como produtor e, ironicamente, o cineasta criativo que abandonou o sistema de estúdios para não ter seu trabalho prejudicado por produtores sem visão criativa tornou-se um produtor que acredita que a qualidade é ditada pelas bilheterias. Tendo se tornado um gigante poderoso em Hollywood, Lucas cercou-se equipes externamente competentes, mas também de bajuladores. Não existe ninguém para chegar até ele e dizer "isto está ruim".
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