segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

CINEMAS NO RIO: No olho da rua.

por Ricky Nobre

Inspirado pelo post de nosso amigo Nanael Soubaim sobre o fim do Belas Artes, resolvi relembrar os cinemas que fizeram parte de minha infância e juventude.

Eu cresci no cinema, todos de rua, claro. Na cinelância, principalmente, que nem sei porque diabos ainda tem esse nome. Quando eu era garoto, vários já tinham fechado (o Regência, que virou a Sala Cecília Meireles, o Plaza que está em ruínas até hoje) ou virado pornôs (Rex, Orly e o Vitória, que voltou a ser normal um ano antes de fechar). Frequentei muito o Metro Boavista (abandonado), o Pathé (virou Universal), o Palácio (que teve a fachada original totalmente recuperada mas não resistiu e fechou de vez) e o Odeon (que chegou a fechar, mas foi belissimamente recuperado pelo Grupo Estação e hoje é o último cinema da Cinelândia).

Na Tijuca, onde moro, era a "cinelándia da zona norte". Tinha o Tijuca 1 e 2 (virou Casa & Video), Art Tijuca (virou Leader), Carioca (virou igreja Universal), América (virou Casas Chamma e hoje é Drogaria Pacheco) e Bruni Tijuca (virou laboratório clínico). Na época de meu pai, a Praça Seans Peña tinha o Olinda, o maior cinema da cidade, com quatro andares e 3500 lugares. Foi demolido e o espaço hoje abriga o Shopping 45. Sim, terreno era TÃO grande que deu pra fazer um pequeno Shopping no lugar.

Hoje no Rio temos apenas os seguintes cinemas de rua: Leblon 1 e 2 e as seis salas do Artplex Botafogo, construído no antigo espaço do cinema Coral. Os outros são de propriedade do Circuito Estação: Espaço de Cinema 1, 2 e 3, Estação Botafogo 1, 2 e 3, Odeon, Estação Museu da República (que funciona dentro do antigo Palácio do Catete) e Estação Ipanema. Tem também o São Luiz 1, 2 e 3. Ele era de rua e nunca fechou, mas acabaram construindo tantas lojas no mesmo prédio que ele é meio de rua, meio de galeria.

EDIT: Esqueci das 3 salas do Roxy em Copacabana, pode?? O último filme que vi ali antes de ser dividido em 3 salas, ainda no início dos anos 90, foi Dick Tracy. Que cinema enorme que ele era...

Existe algo mais do que a falta de segurança na questão do fim das salas de rua. Durante a década de 90, quando ocorreu o golpe de misericórdia, este era um motivo forte, mas hoje não convence, e o motivo de minha certeza é o fechamento recente do Palácio, na Cinelândia. Largado e em péssimas condições técnicas, como todo cinema de rua em seus últmos anos, o Palácio teve um belo canto do cisne. Inspirado pela bela recuperação do Odeon pelo Grupo Estação, o Grupo Severiano Ribeiro resolveu restaurar a fachada original do cine Palácio (perdida numa reforma na década de 70). Fez obras internas, deixou o cinema direitinho e continuou cobrando o baratíssimo ingresso que já cobravam naquele cinema, que era cerca de metade do preço dos cinemas de shopping. Depois de um ano, ele foi fechado por falta de público. Era um lugar perigoso? Não mais. A região da Cinelândia se encontra ao lado da Lapa, que uma vez já foi um lugar largado, perigoso e barra pesada. Hoje é um ponto onde se concentrar muito bares, a maior parte deles bem caros. Os donos dos estabelecimentos se asseguram de que a polícia esteja sempre presente, dando segurança aos seus fregueses que lotam a região todas as noites. Isso acabou dando mais segurança também para a área da Cinelàndia. Então não foi por falta de segurança que o público deixou o Palácio às moscas. As pessoas realmente querem a facilidade de poder estacionar, comer, ver filmes, comprar, tudo num lugar só.

O shoppíng é um templo de consumo e de estilo de vida que as pessoas hoje não abrem mão. A omissão do Estado que permite que importantes pontos culturais da cidade desapareçam é imperdoável. Mas, sejamos francos, as pessoas vão deixar de ir aos shoppings pra ir em cinema de rua, mesmo mais baratos? Os cinemas de rua do grupo Estação só sobrevivem porque trabalham com filmes alternativos, tendo um público bem específico que não tem como ver esses filmes nos shoppings. É interessante notar como esses cinemas tem lanchonetes mais refinadas e livrarias, ampliando o entretenimento do seu público, que possui um nível cultural diverso.

Sendo honesto, gosto muito da qualidade técnica dos cinemas de shopping (nem todos, tem muita porcaria, como as sete horríveis salas do Iguatemi), e a baixa qualidade de som e imagem das salas de rua já me aborrecia no fim da década de 90. Mas tenho sim uma saudade nostálgica dos cinemas que frequentei (e do preço que pagava). A saída para as salas de rua talvez seja mesmo por incentivo estatal. Uma sala de 94 lugares, com projetor 3D foi inaugurada na favela do Alemão, recém pacificada, com ingressos a 4 reais. Todas as sessões lotam. Não seria esta a saída tanto para a revitalização dos cinemas de rua quanto da democratização da cultura cinematográfica, hoje restrita a quem tenha condições de pagar de 14 a 25 reais para ver um filme? Com certeza, essa foi apenas uma iniciativa isolada, já que a pacificação do Alemão é recente e trouxe muito lucro político ao Estado. Mas bem que poderia se tornar uma política pública de cultura de verdade.

3 comentários:

Nanael Soubaim disse...

Antes de a má gestão comprometer a TV Cultura, eu não me importava com a fragilidade da transmissão, nem com a precariedade do áudio da TBC de Goiânia. Qualidade técnica ajuda muito, mas não faz um bom evento cultural.

Ricky Nobre disse...

Nanael, minha nerdice jamais permitiu ignorar baixa qualidade técnica de uma sala de cinema. Não gosto de nada pela metade.

Nanael Soubaim disse...

Nem eu. Dava para unir as duas cousas, qualidade e sociabilidade, mas isto depende da decisão administrativa, enquanto o negócio dá lucro. Muita gente se acomodou (não só no ramo de cinema) e quando acordou, já estava fechando as portas.