Um trabalho de Charlie Kaufman sempre lhe pegará de surpresa.
O roteirista de Quero Ser John Malkovich,
Adaptação e Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças já havia se aventurado na
direção antes. Mas agora ele chega com um filme de animação em stop motion, dirigido em parceria com Duke
Johnson, adaptando sua própria “áudio-peça”. A escolha de filmar seu roteiro
como animação, ainda que seja uma história depressiva com muito palavrão,
nudez, sexo e melancolia, possibilita uma leitura única e talvez, se rodado de
forma tradicional com atores, não conseguisse expressar com precisão as reais
angústias que assombram seu protagonista.
O filme acompanha Michael Stone (com voz de David Thewlis),
um homem de meia idade que chega a uma cidade para uma conferência sobre
atendimento a clientes, assunto no qual ele é especialista. Casado e com um
filho, ele acaba decidindo procurar um antigo amor que ele abandonou 11 anos antes
sem dar explicações. Após o encontro desastroso, ele conhece no hotel Lisa (com
voz de Jennifer Jason Leigh), uma moça simples e de baixa autoestima que estava
na cidade justamente para vê-lo na conferência e ele torna-se totalmente
fascinado por ela.
O fato do filme ser dublado por apenas três atores é um
recurso esteticamente estranho e pode ser até demasiadamente incômodo para o
espectador, mas é extremamente relevante para a própria alma do filme. Enquanto
Thewlis e Leigh dublam seus respectivos personagens, Tom Noonan dubla todos os outros, que são
muitos, inclusive as mulheres e crianças, sem truques de alteração de voz. O
incômodo que isso causa não é gratuito.
É possível antipatizar profundamente com o protagonista
devido a suas atitudes e sua perspectiva profundamente egocêntrica. Mas a forma
como o personagem vai sendo desnudado ao longo do filme tem o poder de nos levar
tão dentro de suas dores e de sua total incapacidade de se conectar
verdadeiramente a outros seres humanos que a sensação final pode acabar sendo
bem diferente.
É surpreendente como, logo nos primeiros minutos de projeção, uma
animação com bonecos seja capaz de nos contaminar com tamanha sensação de
angústia e melancolia. A animação é excepcional e o nível de expressividade dos
bonecos é ímpar. Absoluto sucesso de crítica, Anomalisa custou meros 8 milhões
de dólares e foi financiado por sistema de crowdfunding
(daí a interminável lista de special
thanks nos créditos). É o primeiro longa de animação com classificação R
(17 anos) a concorrer ao Oscar de animação, porém tem tanta chance quanto nosso
representante brasileiro frente ao blockbuster
da Pixar Divertidamente. Mesmo assim é obrigatório. Um dos melhores filmes do ano.
INDICAÇÃO AO OSCAR:
- Melhor longa metragem de animação
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