sexta-feira, 2 de março de 2018

Os Filmes do Oscar: TRAMA FANTASMA – seis indicações

Por Ricky Nobre


Paul Thomas Anderson é presença praticamente garantida no Oscar. Não deixa de ser curioso esse “crush” que a Academia tem pelo seu cinema que não é tão certinho e acessível quanto o que ela normalmente gosta. Porém, mesmo com as sucessivas indicações, o prêmio mesmo nunca chega. Ele é aquele cara legal mas diferentão com quem a Academia gosta de sair, mas não a ponto de se comprometer. Anderson também é garantia quase certa de um cinema refinado, poderoso, classudo e, geralmente, desconfortável. Depois do surpreendentemente ruim Vício Inerente, Trama Fantasma vem como um imenso alívio.

 

Na Londres dos anos 1950, o renomado estilista Reynolds Woodcock (Daniel Day-Lewis) veste artistas, a realeza e a alta-sociedade, tendo como aliada a irmã Cyril (Lesley Manville) no comando da confecção. Solteiro convicto, suas parceiras amorosas são descartadas assim que perdem o encanto. Ao conhecer a garçonete Alma (Vicky Krieps), ele a transforma em sua amante, musa e modelo, mas Alma terá que aprender como viver com a personalidade tirana dele, e ele como viver em um relacionamento amoroso de verdade. 

 

O grande tesouro de Trama Fantasma são os personagens e a capacidade de Anderson e do excelente elenco em nos manter constantemente ligados a eles, ainda que suas personalidades, caráter e escolhas possam nos parecer bastante duvidosos. Não que isso seja uma novidade no cinema do diretor, basta lembrar de filmes como Booggie Nights e Sangue Negro. Essa humanidade dos personagens, sublimes e falhos, amorosos e perversos, sustenta não apenas nosso interesse, mas é a alma do filme. Como era de se esperar, Daniel Day Lewis está sublime e, ao mesmo tempo em que se transforma no personagem, quase nos fazendo esquecer que se trata de um ator, também mantém aquele charme inconfundível, o olhar risonho e sedutor que já o havia rendido outra bela garçonete, a Juliette Binoche, em A Insustentável Leveza do Ser. Lewis tem um incrível talento em interpretar personagens que, mesmo que tenham personalidades reservadas, possuem egos gigantescos e o contraste com seus momentos de fragilidade são essenciais para compreender os rumos da história.

 

Igualmente perfeita está Vicky Krieps, ignorada pelo Oscar, que faz o caminho inverso do personagem de Lewis, pois começa pequenina, ao mesmo tempo deslumbrada e esmagada pela imensidão de Woodcock, e vai, discreta e irreversivelmente, se agigantando na trama. Lesley Manville está igualmente impecável como a irmã que não mede esforços para que o mundo inteiro se movimente exatamente conforme a conveniência do irmão gênio, cuja rotina exata e repleta de nuances é essencial para sua criatividade. Manville, inclusive, dá tons que se remetem, tanto em aparência quanto em essência, a Judith Anderson em Rebecca (1940) de Hitchcock. 

 

A recriação belíssima dos ambientes luxuosos dos anos 50 e os maravilhosos figurinos dignos de um gênio da época ganham a luz deslumbrante de uma fotografia que, escandalosamente, não recebe crédito. O próprio Anderson se propôs a iluminar o filme. Porém, nunca tendo atuado nesta função, recebeu a cada passo as opiniões e conselhos dos operadores de luz e de câmeras. Esse trabalho colaborativo entre o cineasta e os técnicos resultou em um belíssimo espetáculo, provavelmente a mais bela fotografia do ano, que, sem um responsável sindicalizado que assinasse o trabalho, ficou fora das indicações ao Oscar. Igualmente bela e assombrosa é a música de Jonny Greenwood, membro da banda Radiohead e compositor erudito (!!!) em sua quarta colaboração com Anderson, que, trabalhando basicamente com atonalidade e ocasionalmente com belos temas harmônicos, cria uma atmosfera de desequilíbrio e romantismo que é perfeita para o filme.

 

Entrar em detalhes de Trama Fantasma seria estragar suas assombrosas e desconfortáveis surpresas. O que se pode dizer é que o filme se sustenta brilhantemente como um estudo de um relacionamento doentiamente disfuncional onde os integrantes encontram harmonia e sincronicidade de formas inesperadas e até mesmo nefastas. Uma linda história de amor. 

 

 COTAÇÃO:



TRAMA FANTASMA (Phantom Thread, 2017)

Com: Daniel Day-Lewis, Vicky Krieps, Lesley Manville, Gina McKeem e Brian Gleeson

Roteiro e direção: Paul Thomas Anderson

Fotografia: Paul Thomas Anderson (não creditado)

Montagem: Dylan Tichenor

Música: Jonny Greenwood



INDICAÇÕES AO OSCAR:

Melhor filme

Diretor: Paul Thomas Anderson

Ator: Daniel Day-Lewis

Atriz coadjuvante: Lesley Manville

Música original: Jonny Greenwood

Figurinos: Mark Bridges


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