sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Os filmes do Oscar: MEMÓRIAS DE MARNIE (uma indicação)


Por Ricky Nobre


Quando  Hayao Miyazaki, Isao Takahata, Toshio Suzuki e Yasuyoshi Tokuma se juntaram e fundaram o Studio Ghibli em 1985, sob a luz do sucesso de Kaze No Tami No Nausicaä no ano anterior, eles provavelmente não faziam ideia que estavam criando um dos estúdios de animação mais amados do mundo. Vinte filmes (vinte e um se contarmos que Nausicaä foi incorporado ao catálogo do estúdio) haviam sido feitos até 2013, quando o principal nome da empresa, o mestre Hayao Miyazaki, anunciou que Vidas ao Vento seria seu último filme, consolidando sua aposentadoria. Logo após este anúncio, o estúdio lançou uma nota oficial afirmando que o filme que estava em produção naquele momento seria o último lançado e que ele entraria em recesso para ser reestruturado. Pânico se instalou nos corações de fãs do mundo inteiro. Omoide no Marnie seria o último filme do Studio Ghibli.


Hiromasa Yonebayashi foi animador de quase metade dos filmes do estúdio, até estrear na direção com O Mundo dos Pequeninos em 2010. Para seu segundo filme, optou por adaptar When Marnie Was There, um romance lançado pela inglesa Joan G. Robinson em 1967. No filme, Anna é uma menina órfã de 12 anos que sofre de asma. Sua mãe adotiva (que ela chama de tia) a manda para a casa de parentes no interior, onde o ar puro pode ajudar a recuperar a saúde. Na nova cidade, Anna faz o que fazia onde morava: foge desesperadamente de qualquer possibilidade de interação social. Ela acredita que exista no mundo um círculo invisível onde a maioria das pessoas está dentro e ela está fora. Exímia desenhista, ela nunca deixa ninguém ver suas obras, pois acredita estarem sempre ruins. Sentindo-se permanentemente desconectada do mundo, sonha em ser “normal”, enquanto acredita que o mundo a vê como feia, burra, temperamental, desagradável. Anna odeia a si mesma. 


Fascinada por uma mansão abandonada construída no meio de um pântano cujas águas sobem à noite, Anna a visita durante o dia a vasculha suas ruínas. Numa noite, decide visitá-la depois que a maré sobe e conhece Marnie. Ela é linda, gentil, esperta, divertida, se veste lindamente, enfrenta a tirania das babás. Marnie é tudo que Anna gostaria de ser e, o mais impressionante, possui profundo carinho e amizade por Anna. 


No desenrolar da história, um pequeno quebra cabeças vai se formando a partir de alguns fragmentos de informações para que o público e a própria Anna possa desvendar o mistério de Marnie, que vive como que numa dimensão paralela, que só existe ao subir da maré, onde a mansão abandonada se torna palco de lindas e sofisticadas festas da rica família. Mas o mistério de quem é Marnie e como ela e seu mundo aparecem apenas para Anna, apesar de ser habilmente mantido pela narrativa, onde o público conjectura diversas possibilidades, não protagonizam a trama. O espetáculo que presenciamos é a jornada emocional de Anna. Perceber-se amando e sendo amada de forma tão imensa, tão doada, é uma absoluta novidade na vida de Anna que, com as questões que tem e vão sendo reveladas ao longo do filme, não percebia o amor que já recebia, sentindo-se mais abandonada pela família morta do que acolhida pelos que a receberam. E essa enorme cumplicidade com a amiga traz profundas transformações.


Não é novidade a capacidade dos animadores nipônicos em lidarem com emoções, transformando seus personagens desenhados em atores excepcionais, tão pouco é nova a delicadeza e a exuberante beleza dos filmes do Ghibli. Memórias de Marnie, tendo ares de canto do cisne do estúdio, é uma síntese e uma apoteose do seu legado. Extraordinariamente bem animado, repleto dos mais ínfimos e sensíveis detalhes, Marnie fala de amor, amor de mulheres, entre mulheres, e como esse amor resgata corações, almas e auto-estimas despedaçadas. Talvez o filme mais completa e proeminentemente definido pelo amor desde A Cor Púrpura. Um amor que salva vidas e resgata histórias. É imperativo sentar-se pela primeira vez (ou pela segunda, terceira...) vez diante de Memórias de Marnie com uma caixa de lenços. Acredite você ou não que este é o fim do Studio Ghibli.
 


PS: O título brasileiro é tradução literal do título em japonês. O título internacional em inglês é o mesmo do livro original. O site Studio Ghibli Brasil promoveu uma enquete para escolher o título brasileiro que consistia nas traduções literais dos dois títulos oficiais e uma terceira opção, “Quando Estou com Marnie”. Venceu a tradução do original japonês.

INDICAÇAO AO OSCAR:
Melhor longa metragem de animação

4 comentários:

Nanael Soubaim disse...

Só por esta crítica já mereceria um Oscar!

Ricky Nobre disse...

^____^ Arigato!

Iza Pinheiro disse...

Eu vi esse filme ^^!!

Eddie disse...

A critica me convenceu a ver!