segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Os Filmes do Oscar: BOHEMIAN RHAPSODY – 5 indicações

Por Ricky Nobre


A cada cinebiografia lançada, repete-se a mesma dança: as discrepâncias entre os fatos reais e o que é retratado no filme geram diversas controvérsias e indignações. Seja o ato de condensar vários acontecimentos ou personagens em um só, seja alterar a ordem dos fatos para efeito dramático, seja simplesmente inventar o que não aconteceu porque a verdade é inconveniente ou, simplesmente, chata. Por necessidade, capricho ou má fé, as cinebiografias nunca serão a reprodução exata da realidade. Bohemian Rhapsody chega com a intenção de ser um retrato da trajetória do Queen, e consegue ser, em parte. Mas, no fundo, é mesmo o que o público espera que seja: um filme sobre Freddie Mercury.

 

Stephen Frears chegou a comandar o projeto com Sacha Baron Cohen como Freddie, mas os demais membros do Queen, Brian May e Roger Taylor, que atuavam como produtores, não concordavam em se concentrar apenas no vocalista e queriam que fosse um filme sobre a banda. Pelas mãos de Brian Synger, o filme parece ter atingido um meio termo: ainda tem Mercury como protagonista mas dá um foco bem maior nos demais membros do que era de se esperar. O filme acompanha o jovem filho de paquistaneses, que não tem afinidade alguma com os pensamentos tradicionais da família, em seus primeiros passos no mundo da música, e a ascensão meteórica da banda, os conflitos, amores, separações, vícios e traições. 

 

De cara, uma coisa que diferencia Bohemian Rhapsody dos demais filmes sobre músicos, ou mesmo outros artistas, é que alguma atenção foi dispensada em retratar a arte em si e seus processos criativos. As cenas que retratam sessões de gravação e processos de composição elevam o filme ao tornar a arte criada por seus personagens tão relevante quanto seus dramas pessoais ou os escândalos em que se envolveram, aspectos que acabam sendo o foco único da imensa maioria das cinebiografias de artistas, como se o único motivo desses filmes serem feitos fosse a exploração sensacionalista da “vida loca”. Nesse aspecto, o filme se destaca da mesmice.

 

No que tange à velha polêmica da “fidelidade”, o filme é um balaio misto. Muito trabalho e dinheiro foram investidos na reconstrução visual da época. O estádio de Wembley foi reconstruído exatamente como era em 1985 durante o Live Aid, chegando a impressionar Bob Geldof, idealizador do concerto, pela fidelidade em cada detalhe. A recriação do show do Live Aid, em si, é um absoluto primor, estudada e replicada em seus mínimos nuances. O quarteto de atores que interpreta o Queen também impressiona, seja pela semelhança física, seja pela recriação dos personagens. Rami Malek, obviamente, é o grande destaque do elenco. A forma como ele se comporta no palco é realmente impressionante, e desde The Doors de Oliver Stone não se tem a impressão tão nítida de que voltamos no tempo e estamos vendo novamente a banda real ali. 

 

Por outro lado, se o visual é tão impressionantemente idêntico, o roteiro é uma salada de fatos, boatos, recriações e invenções. Enquanto muita coisa cai no recurso de condensação para acelerar a história, outros são a mais pura ficção, como toda confusão envolvendo o álbum solo de Mercury e o Live Aid, tornando o filme alvo de muitas críticas. Mas talvez o maior problema do filme seja uma certa superficialidade do roteiro. Nada é muito aprofundado, sejam fatos ou personagens, e fica a impressão de que o público não chega realmente a conhecer aquelas pessoas, só mesmo Mercury, e muito superficialmente. 

 

Bohemian Rhapsody teve uma produção atribulada. Brian Synger foi demitido após desaparecer das filmagens em diversas ocasiões, e a Fox tratou de contratar Dexter Fletcher para substituí-lo nas duas últimas semanas de filmagem e por todo o processo de pós-produção. Mas talvez seja leviano apontar esses percalços como responsáveis pelos problemas do filme. De fato, a ficcionalização de parte da história quebra o mito de que a participação dos biografados garante uma biografia fiel. May e Taylor não pareceram ver problemas em inventar uma briga entre o grupo que nunca existiu. De qualquer forma, mesmo os que conhecem melhor a história da banda e percebem os problemas, quanto aqueles que nada sabem e compram o que o filme mostra como realidade, vão sair do filme com um gosto muito bom na boca. Com a grande apoteose final sendo a fidelíssima recriação do show do Live Aid, Bohemian Rhapsody se consagra como uma tocante homenagem a Mercury e a uma das maiores bandas de todos os tempos. Com um final desses, você até esquece os problemas e sai com a impressão de que viu um filmaço.



COTAÇÃO:


BOHEMIAN RHAPSODY (2018)

Com: Rami Malek, Lucy Boynton, Gwilym Lee, Ben Hardy, Joseph Mazzello, Aidan Gillen, Allen Leech e Mike Myers

Direção: Bryan Singer e Dexter Fletcher (não creditado)

Roteiro: Anthony McCarten        

Fotografia: Newton Thomas Sigel

Montagem e música original: John Ottman



INDICAÇÕES AO OSCAR:

Melhor filme

Ator: Rami Malek

Montagem: John Ottman

Edição de som: Nina Hartstone e John Warhust

Mixagem de som: Paul Massey, Tim Cavagin e John Casali

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