Por Ricky Nobre
E mais uma vez um dos melhores filmes do ano recebe uma
indicação solitária de consolação. Viggo Mortensen concorre a melhor ator
interpretando o fantástico pai de três filhos e três filhas que cria e educa os
rebentos de um jeito, digamos assim... um tanto... peculiar. Vivendo no meio do
mato, Ben ensina os filhos de 5 a 17 anos (com nomes de fazer inveja à prole de
Baby e Pepeu) a viver em comunhão com a natureza, caçar, técnicas de
sobrevivência, pesado treinamento físico, literatura, política, sociologia,
filosofia, física quântica... É uma espécie de comunidade hippie anabolizada.
Sofrendo de transtorno bipolar, a mãe das crianças permanece hospitalizada por
alguns meses. No caminho para visitá-la, Ben descobre que ela cometeu suicídio.
Ao saber que seu desejo final de ser cremada não seria respeitado pelos pais, a
família parte para uma missão de resgate do corpo da mãe.
A direção e o roteiro de Matt Ross (vencedor de melhor
diretor na mostra Un Certain Regard em Cannes) lançam um olhar extremamente
simpático a Ben, ainda que seus métodos pedagógicos sejam, muitas vezes,
questionáveis ou simplesmente absurdos. Essa simpatia é vital para manter na
mente do espectador o fato de que aquelas crianças realmente idolatram os pais,
ainda que alguns conflitos aconteçam. Pode parecer terrivelmente chocante para
parte do público a alegria da garotada em receber armas brancas de presente no
Dia de Noam Chomsky (que eles celebram em vez do Natal); ou a forma
chocantemente direta que ele responde perguntas sobre sexo ou morte, mesmo para
as crianças mais novinhas, sob a justificativa de que ele não mente para os
filhos; ou ainda, a brutalidade do treinamento físico, que poderia ser
considerada abuso infantil em qualquer sociedade civilizada.
Ao mesmo tempo em que ele incentiva constantemente o
pensamento crítico (a cena em que Kielyr analisa Lolita é perfeita), Ben por
várias vezes impõe sua autoridade de forma severa, anulando os questionamentos
que ensinou os filhos a ter. Ben quer que suas escolhas na criação dos filhos
sejam respeitadas, mas não se furta até mesmo a humilhar uma família que tem
padrões e hábitos típicos do americano médio, ainda que, ao fazê-lo, exponha de
forma muito clara a absoluta tragédia que é o sistema educacional americano.
Muitas das críticas ao filme vêm com o argumento de que ele acaba, com seu humor e imensa simpatia, por celebrar uma forma de
educação brutal e abusiva. Mas o diretor Matt Ross conta com a capacidade do
público em ler sutilezas. Se Ben criou uma filha de 8 anos capaz não só de
recitar, mas de discutir com inteligência a Carta de Direitos americana, criou
também um filho de 17 anos completamente destituído de habilidades sociais,
capaz de passar para as sete melhores universidades do país, mas sem ter a
permissão do pai de cursar alguma. O público percebe isso e, quando várias
coisas começam a dar errado, fica claro que algo naquela família precisa ser
repensado, a ponto do sogro, retratado todo o tempo como o vilão, acabar
soando como a voz da razão.
Ben precisa enfrentar a realidade de que não criou seus filhos para o mundo real. Mas para que espécie de mundo a educação “normal” forma as pessoas? Uma coisa que fica inquestionavelmente clara é o quanto o
amor está presente naquela família, e o quanto o amor guiará as decisões que
Ben precisa tomar. Pais e mães, mesmo falhando, e muito, tentam fazer o melhor
que podem, o que sabem fazer. E só dá pra aprender errando.
INDICAÇÃO AO OSCAR
Ator: Viggo Mortensen
Em praticamente todos os tapetes vermelhos, o elenco do filme "deu o dedo" pra todo mundo!
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