sábado, 25 de fevereiro de 2017

Os filmes do Oscar: MANCHESTER À BEIRA MAR (6 indicações)


Por Ricky Nobre 




Histórias de grandes tragédias pessoais costumam ter uma abordagem padrão em Hollywood. Geralmente, servem como base para filmes “inspiradores”, que mostram personagens passando por experiências traumáticas e enfrentando enormes dificuldades para, no final, deixarem uma bela mensagem sobre fé, persistência e superação. Isso absolutamente NÃO descreve Manchester à Beira Mar. 

 

Lee (Casey Affleck, sensacional) é um faz tudo num condomínio que leva uma vida monocórdica, fazendo reparos em apartamentos em troca de um salário mínimo e um quartinho pra dormir. Quando o irmão que sofria de uma doença cardíaca acaba falecendo, Lee descobre que este havia determinado em testamento que ele deveria tornar-se o tutor do sobrinho (Lucas Hedges), sem jamais ter discutido isso com o irmão. Lee passa algumas semanas cuidando do sobrinho na casa deste, mas pretende levá-lo para sua própria casa, numa cidade vizinha, para morar permanentemente com ele, sob os veementes protestos do garoto que não vê motivo para se afastar de sua escola e de todos os seus amigos. 

 

O filme do escritor e diretor Kenneth Lonergan não é feito de momentos arrebatadores, muito pelo contrário. Salvo talvez uma única cena de profundo impacto dramático, Manchester à Beira Mar é feito de frases, gestos e ações simples, mas carregadas de emoção dolorosamente contida. Nisso, o texto contido e discreto, que prefere dizer muito com pouco, depende muito de seu elenco, e Lonergan foi extremamente feliz ao escalá-lo. O filme, de fato, deveria ser dirigido e interpretado por Matt Damon. Mas uma série de atrasos o deixou apenas como produtor, e Lonergan assumiu a direção do roteiro que escreveu e Affleck acabou ficando com a oportunidade de mostrar o gigante de ator que é. Toda a raiva, culpa, tristeza, frustração e medo de Lee são expressos com impressionante atenção aos detalhes, olhares, posturas corporais e com o desconfortável silêncio do personagem. Lucas Hedges também se sai muito bem e Michelle Williams prova porque uma personagem com tão pouco tempo na tela precisava de uma atriz do seu calibre para interpretá-la, mostrando mais uma vez porque é uma das melhores e mais subestimadas atrizes de sua geração.

 

Os flashbacks que contam a vida de Lee antes de se tornar um faz tudo recluso entremeiam a narrativa muitas vezes sem uma separação temporal clara, e é preciso atenção do espectador para separar passado e presente sem se confundir. Mas a principal dica que entrega claramente o que é passado e futuro é o próprio Lee. No passado ele é leve, engraçado, amoroso, vivo. No presente é fechado, vivendo no automático, falando o mínimo possível e arrumando brigas em bares absolutamente sem motivo algum. A trilha musical é composta apenas com peças clássicas, algo que às vezes apresenta problemas. A cena-chave que mostra a grande tragédia da vida de Lee acontece ao som do Adágio em Sol Menor, de Albinoni, peça excessivamente conhecida, o que pode gerar alguma distração.

 

A tragédia que mudou a vida de Lee e que passou a defini-lo é a mesma que inicialmente o faz pensar que a melhor decisão é incluir o sobrinho em sua vida de zumbi, sem objetivo. Mas também pode ser a que o fará tomar sua decisão final, talvez não a certa, mas a melhor que ele pode tomar. Manchester à Beira Mar não é um filme sobre superações exemplares. É sobre pessoas comuns vivendo com dores profundas e tentando fazê-lo da melhor forma possível. Se sua impressão será de um final triste que é feliz ou de um final feliz que é triste, depende apenas de você. 

 

INDICAÇÕES AO OSCAR

Filme

Diretor: Kenneth Lonergan

Ator: Casey Affleck

Ator coadjuvante: Lucas Hedges

Atriz coadjuvante: Michelle Williams

Roteiro original: Kenneth Lonergan

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